As elites tradicionais da Colômbia ligaram novamente seus sonoros alarmes depois que o governo do presidente Gustavo Petro ordenou, na manhã desta quarta-feira (3), a intervenção em uma das empresas mais poderosas do setor de saúde, considerada a joia da coroa dos banqueiros do país.
Argumentando que suas contas não estão claras e que o descontentamento de seus usuários está aumentando, a prestadora de saúde Sanitas ficou nas mãos de um interventor nomeado pela Superintendência de Saúde para – conforme se afirmou – evitar que a empresa tenha que ser liquidada a médio prazo.
Com quase 6 milhões de filiados, Sanitas é a segunda maior empresa do setor, depois da Nueva Eps, que também está sob intervenção e é operada pelo Governo, o que a oposição e os sindicatos patronais não duvidam em qualificar como um processo de “estatização” dos serviços públicos, como o presidente Hugo Chávez (2002-2013) fez na vizinha Venezuela.
Como costuma acontecer sempre que Petro anuncia as suas decisões, o primeiro a se pronunciar sobre a intervenção na Sanitas foi o ex-presidente Álvaro Uribe (2002-2010), que qualificou a medida de “ditatorial”: “por bem ou por mal, parece ser o desígnio oficial para que a cidadania fique sem boas seguradoras de saúde e, no final, somente disponha de estatismo, burocratismo e politicagem. Quem no setor privado voltará a investir em prestadores de serviços de saúde?”, perguntou o ex-presidente.
E como sempre acontece quando Uribe o interpela, Petro não tardou em respondê-lo por meio de sua rede social favorita, o aplicativo de mensagens X: “Nenhum estatismo, estimado ex-presidente Uribe: todas as clínicas, hospitais e consultórios que eram pagos pela Sanitas com dinheiro público seguirão, sem intermediários, sendo pagos com dinheiro público, ou seja, crescerão”, assegurou o atual chefe de Estado.
Após o meio-dia de quarta, a atenção do público se voltou ao Senado da República, em cuja sétima comissão foi submetida à votação uma proposição para arquivar o projeto de lei apresentado há mais de um ano pelo governo com o objetivo de dar uma virada ao setor, através de uma audaciosa reforma cujo eixo era a eliminação de intermediários financeiros, e a colocação em marcha de um ambicioso modelo de medicina preventiva e a ampliação da cobertura de serviços para as áreas marginais da periferia, em zonas rurais e urbanas.
Considerado como derrota do governo, o afundamento desta iniciativa – segundo a maioria dos analistas locais – obriga o presidente a buscar novos caminhos para impedir que seu pacote de reformas sociais naufrague nos instáveis labirintos do poder legislativo.
De acordo com o que foi o visto até hoje nos ambientes do Senado e da Câmara de Representantes, com as outras reformas-bandeiras de Petro – aposentadoria e trabalhista – poderiam correr a mesma má sorte da iniciativa sobre saúde, pois as maiorias legislativas da oposição estão apelando ao velho truque de impedir que haja quórum decisório nos debates.
O interesse pela saúde tem feito vir à tona um novo tema de discussão que preocupa ainda mais os setores tradicionais do empresariado e da política: a intenção de impulsionar uma Assembleia Constituinte, expressada por Petro há um par de semanas, sinal de que o chefe de Estado não ficará de braços cruzados enquanto vê como a atual institucionalidade lhe fecha o passo para reformas adiadas por décadas.
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