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Economia estagnada, privatizações e desemprego: 13 impactos do golpe de 2016

O imperialismo norte-americano estava emitindo claros sinais de que não iria mais tolerar nenhum governo progressista na região
José Álvaro de Lima Cardoso
Outras Palavras
São Paulo (SP)

Tradução:

“O Brasil não é um terreno aberto onde nós iremos construir coisas para o povo. Nós temos que desconstruir muita coisa” (Jair Bolsonaro, em 18/03/2019, na sede da Agência Central de Inteligência norte-americana – CIA, em Washington)

O senado federal aprovou a admissibilidade da denúncia que pediu o afastamento da presidente da República, Dilma Rousseff, por crime de responsabilidade em 12 de maio de 2016. O processo tinha se iniciado antes na Câmara Federal. Mas se tomarmos essa data como um marco, portanto, já temos quase quatro anos do golpe de Estado. É evidente que se pode tomar outros períodos como referência, porque o golpe começou a ser articulado, no mínimo, em 2012. Os indícios de que algo estava mudando no continente eram muito fortes. Nessa data já havia ocorrido o golpe de Honduras (2009) e Paraguai (2012). O imperialismo norte-americano estava emitindo claros sinais de que não iria mais tolerar nenhum governo progressista na região.

É necessário entender os fundamentos do golpe, não podemos ficar reagindo, como se fosse surpresa, a cada novo ataque do governo fascista aos direitos e à soberania. É importante entender o pano de fundo sobre o qual o processo se desenrola, do contrário, ficaremos apenas na reação à última maldade contra a população, por parte dos que estão no poder. A audácia do golpe que aplicaram no Brasil (e em vários países do subcontinente latino-americano), demonstra que os golpistas não irão entregar o poder de mão beijada para a população nos próximos anos. Bolsonaro é uma continuidade, um aprofundamento do golpe. Apoiou o golpe, foi apoiado pelos golpistas, por toda a direita e, principalmente, apoia e aprofunda o tempo todo o programa de guerra contra o povo. O que os golpistas fizeram em quase quatro anos não foi brincadeira:

O imperialismo norte-americano estava emitindo claros sinais de que não iria mais tolerar nenhum governo progressista na região

Imagem: Flávio Tavares
Brasil, O Golpe: A Ópera do fim do mundo (2018)

Confira os treze pontos:

1. Enfraqueceram o Estado nacional de muitas formas (financeiramente, politicamente, diplomaticamente, militarmente). Como é um golpe coordenado pela burguesia mais forte do planeta, contra uma país subdesenvolvido, a ideia é desmontar todo desejo que brasileiros possam ter de ser uma nação soberana;

2. Estão entregando as riquezas nacionais para o estrangeiro – o objetivo econômico central do golpe foi petróleo (que é “o golpe dentro do golpe”), mas estão de olho na Amazônia, metais de todo tipo, água, grafeno, nióbio, etc. E nas riquezas não naturais, as empresas estatais;

3. Estão destruindo as políticas de segurança alimentar e fazendo a fome aumentar exponencialmente no Brasil. Em apenas três anos após ter saído do Mapa da Fome da ONU (2014), o Brasil retornou para o famigerado Mapa. O fato de um país com recursos abundantes como o Brasil ter uma parcela expressiva da população que passa fome revela a face cruel e atrasada da burguesia brasileira;

4. Acabaram com as políticas de soberania energética que a duras penas vinham sendo montadas. O que estão fazendo com a Petrobras irá comprometer a segurança energética do país e está implicando na dependência externa de combustíveis. Pretendem entregar todo Sistema Eletrobras;

5. Estão tentando privatizar o que for possível. Venderam a Embraer a preço de banana, que virou uma divisão da Boeing. Apesar de dispor de poder para tanto, o governo dos golpistas não vetou o negócio. Pretendem privatizar o que for possível e rapidamente. Sistema Eletrobras, Correios, Banco do Brasil, CEF estão na mira. A privatização dos Correios está planejada para o final de 2021 e pode acarretar demissões de 40 mil pessoas. Se a correlação de forças permitir, entregarão a Petrobras também. Há 119 ativos federais listados para serem vendidos a preços de bananas;

6. Querem entregar as reservas estratégicas de água para as multinacionais, incluindo o Aquífero Guarani. Temer teve inclusive encontros com as multinacionais que controlam a água no mundo. Aprovaram uma lei em dezembro/19 que possibilita acesso às fontes de água por empresas estrangeiras;

7) Reduziram drasticamente o orçamento em ciência e tecnologia. Em 2013 o orçamento no setor foi de R$ 8,5 bilhões Em 2019 foi de 4,4 bilhões, mas cortaram 42%, ou seja, caiu para R$ 2,6 bilhões;

8) Congelaram gastos primários (como educação e saúde) por 20 anos, PEC 95, a chamada Emenda da Morte, que nem países que perderam guerras aceitaram assinar. Só em 2019 o orçamento da saúde perdeu R$ 19 bilhões por conta da emenda da morte;

9. Acabaram com a democracia, fazendo justiça seletiva através da Farsa à Jato e aumentando a repressão para cima dos movimentos sociais. Índios, sem terras e outras minorias políticas estão morrendo que nem moscas;

10. Destruíram as leis trabalhistas, e com elas desmontaram o mercado de trabalho e a renda. São 27,585 milhões de trabalhadores subutilizados (desempregados, subocupados, desalentados ou na inatividade por falta condições) e 12,575 milhões de trabalhadores desempregados;

11. Com o golpe explodiu a desigualdade social. Desde quando, em 1960, o IBGE passou a coletar informações sobre o rendimento da população nos censos demográficos, nunca se havia observado um crescimento tão elevado em tão pouco tempo, como no Índice de Gini e outros indicadores;

12. O golpe causou a maior estagnação econômica da história do Brasil. Não há registro anterior, nas contas nacionais, de cinco anos de recessão e/ou estagnação;

13. A década que se encerra em 2020 poderá ser considerada perdida para indústria. Nos últimos nove anos (2011 a 2019) a perda acumulada é de 15% na indústria. Após cinquenta anos, o Brasil caminha para sair do ranking dos 10 maiores países industriais do mundo;

Se a política é de entrega das riquezas nacionais, os direitos, da mesma forma, não conseguem se sustentar. Há uma relação direta entre soberania e direitos da população. Mesmo porque uma parte das conquistas da sociedade custa dinheiro, e há que financiar com recursos públicos que, em parte são arrecadados com as riquezas que o país possui.

O pecado dos governos anteriores ao golpe de 2016 foi quererem executar políticas com um mínimo de soberania. Aproximação com China e Rússia, via BRICS, conquista de mercados na América do Sul e África, aposta em empresas nacionais, reanimação da indústria bélica (construção do submarino atômico e outros convencionais, em parceria com a França, a compra dos helicópteros da Rússia e dos jatos da Suécia, sempre com transferência de tecnologia), exploração soberana do pré-sal e colocação deste à serviço do povo. Tudo isso fez o Brasil entrar em rota de colisão com os interesses do imperialismo, especialmente o norte-americano. Não entender esse processo, é abdicar de compreender o que acontecerá no Brasil nas próximas décadas.

José Álvaro de Lima Cardoso, Economista, doutor em Ciências Humanas pela Universidade Federal de Santa Catarina, supervisor técnico do escritório regional do DIEESE em Santa Catarina


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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