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ToggleO Peru vive uma crise dramática desde 7 de dezembro último, a partir da ilegal destituição do presidente Pedro Castillo, imposta pelo Parlamento sob controle da ultradireita peruana que ordenou sua detenção no mesmo dia da mensagem do mandatário à nação, condenado uma semana depois pela Sala Penal Permanente da Corte Suprema a 18 meses de cárcere, o que provocou um levantamento popular em várias regiões, reprimido pela polícia desde o primeiro momento e depois pelo exército quando os golpistas impuseram o estado de exceção e outras medidas ditatoriais.
O governo de Dina Boluarte e o parlamento são responsáveis pelos massacres provocados pela repressão e que continuam até agora. Boluarte, vicepresidenta de Castillo, já fôra “cooptada”, traindo aqueles que votaram nela, imposta pela ultradireita como presidenta pensando que podia ganhar alguns dos setores que apoiaram o mandatário detido. Não conseguiu e a militarização continua estendendo-se pelas regiões onde a população sobrevive no terror de uma ocupação militar das forças especiais peruanas e das tropas dos Estados Unidos, que estão há anos no Peru e ocupam uma amplíssima zona do território deste país.
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O silêncio sobre esta presença se transformou em uma cumplicidade aberta; além de desconhecer que este golpe parlamentar, midiático, judiciário e político da direita sob controle de Washington é parte do Projeto Geoestratégico de Recolonização da América Latina publicamente reconhecido pelos governantes estadunidenses. Até quando os silêncios cúmplices?
Na realidade o golpe vinha sendo preparado desde que Castillo assumiu o governo, em 28 de julho de 2021, quando a direita pró estadunidense obstaculizou cada medida deste governo, além das próprias debilidades, que não são um argumento válido quando se lê o que sucedia desde os anos em que governou o ditador Alberto Fujimori (julho de 1990 – novembro de 2000) que em 1992 dissolveu o Congresso, interveio no Poder Judiciário, assumiu o controle de todos os meios de comunicação e deixou a mão livre para a ilimitada repressão e para os esquadrões da morte. Em 1993 impôs uma constituição, similar ao que fez o ditador Augusto Pinochet no Chile.
Até agora Fujimori está detido tanto, pela escandalosa corrupção que continua angustiando este país como pelos crimes de lesa humanidade cometidos durante seu governo, devendo cumprir uma sentença de 25 anos de prisão, que agora ninguém sabe se vai cumprir. Ainda não se dispõem de todos os dados necessários para mostrar a quantidade de massacres em zonas camponesas, além dos assassinatos e desaparecimentos cometidos naqueles anos, a posteriori e até agora.
Peruanos se preparam para sofrer perseguição política feroz por parte das forças armadas e policiais, que declararam “guerra antiterror"
José Williams Zapata
Em uma investigação, em artigo publicado no jornal La Jornada daquele país, o jornalista Carlos Fazio, uruguaio residente no México, garante que “o principal operador da trama golpista no Parlamento foi seu atual presidente, o general da reserva José Williams Zapata, ex chefe do Comando Conjunto das Forças Armadas do Peru e representante do grupo conservador Avança País, que durante o segundo turno das eleições de 2021 apoiou a ultradireitista Keiko Fujimori, contra seu oponente, Pedro Castillo, que se elegeu”.
Em 2006 Williams Zapata era presidente do Comando Conjunto do Exército, sendo acusado de graves ações de corrupção e em 2021 de encobrimento no massacre de Accomarca (1985), quando foram assassinados 69 comuneiros. Também figuram seus antecedentes temíveis, indicados pela própria Administração do Controle de Drogas (DEA) dos Estados Unidos quando era chefe da Regiãon Militar Norte de Piura (de 2004 a 2005) inclusive vinculado com importantes carteis do narcotráfico do México.
Ponto a ponto: as falhas e ilegalidades do Congresso e da Justiça do Peru contra Castillo
Um personagem como Williams Zapata é sem dúvida alguém a quem se pode ocultar as informações quando já estão sob controle do Pentágono. Esta e outras são as razões pelas quais o general, agora parlamentar, “foi um dos principais articuladores do plano golpista partindo do Congresso contra Castillo, coordenado com o alto comando militar peruano e a embaixadora dos Estados Unidos em Lima, Lisa Kenna, uma ex agente da Agência Central de Inteligência (CIA), “que se apoiou no agregado militar desta missão diplomática, Mariano Alvarado, oficial de operações do Grupo de Assistência e Assessoramento Militar do Pentágono (MAAG), que mantem estreito contato com os generais peruanos”.
É incrível que se tenha argumentado que Castillo ia instaurar um governo de emergência e exceção, o que, segundo os “democráticos” parlamentares “alteraria a ordem constitucional e a paz pública”, além de que “o presidente deposto podia fugir devido à tentativa de asilar-se na embaixada do México em Lima”.
Estado de exceção
Precisamente, a primeira ordem de Boluarte, por ordem do comando central foi instalar o Estado de exceção e outras medidas ditatoriais desde 15 de dezembro último, para deixar o território livre para os “especialistas” em combater “a subversão e o terrorismo”.
Isto agravou a rebelião popular que surgira em várias regiões do país, exigindo a liberdade imediata do ex mandatário, ao mesmo tempo em que se exige a dissolução do Parlamento e a convocação de uma Assembleia Constituinte, depois do povo ter suportado seis presidentes em seis anos. O caso parece um beco sem saída.
A tudo isto, acrescenta-se a existência de uma quantidade de bases militares e estabelecimentos dos Estados Unidos, assim como a presença de tropas norteamericanas em lugares estratégicos. Disso ninguém fala, como se não significasse um fator de máxima importância uma crescente ocupação militar estrangeira na vida de uma nação.
A trama golpista
Segundo fontes ligadas a dirigentes de corporações transnacionais em Lima, a trama golpista teria sido urdida desde setembro passado, como parte de uma sofisticada operação de inteligência.
Como o Congresso não contava com os votos necessários para destituir o presidente Castillo, levaram-no a acreditar “que contava com o apoio das forças armadas e da polícia e o induziram a dissolver o Parlamento (para que rompesse a ordem constitucional) falsificando pesquisas (que só mostraram a ele) e lhe fizeram crer que tinha mais de 40% de apoio popular e o Congresso só 8%, razão pela qual ia ser muito fácil derrubá-lo; e que seria aclamado pela multidão, relata Fascio.
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Além do exército e da polícia, “o plano incluía a promotoria da nação, a controladoria, ministros, congressistas e a vicepresidenta Boluarte. Depois que o presidente leu sua mensagem à nação, vários ministros renunciaram em série. Então Castillo buscou o apoio das forças armadas mediante seus decanos militares e não obteve resposta. Aí se deu conta de que tinham lhe armado uma cilada, mas já era tarde. Inclusive, a segurança do Estado reteve-o no palácio enquanto esperavam a votação do Congresso para desaforarlo. Então lhe disseram que estava acertado um suposto plano B: que buscasse asilo na embaixada do México (um dos conspiradores negociara o asilo diplomático de Castillo na missão mexicana).
Mas instantes depois do Congresso declarar sua destituição foi detido por um comando SWAT da polícia nacional. Levaram-no à controladoria e imediatamente apareceu a fiscal da nação, enquanto Dina Boluarte, símbolo da traição, esperava em sua casa para ser chamada a assumir como presidenta da república, tal como aconteceu.
O único que não esteve na trama golpista foi o comandante geral do exército, Walter Córdova, que, segundo o jornal La República, em 5 de dezembro fora pressionado pelo titular do Parlamento, José Williams, para que deixasse o cargo “porque havia graves denúncias contra ele que afetavam a institucionalidade do Exército”, uma típica extorsão.
Lisa Kenna, a Embaixadora
Ainda na véspera do golpe, a embaixadora dos EUA, Lisa Kenna, reuniu-se com o ministro da Defesa, Gustavo Bobbio, e este, assim como Córdova, apresentou sua renúncia em 7 de dezembro. Segundo o diário limenho, a última chamada telefônica que Castillo recebeu antes de abandonar o palácio presidencial veio da embaixada dos EUA. O secretário de Estado, Antony Blinken, tinha bendito o golpe e reconhecido Boluarte.
Também foram os Estados Unidos que estiveram por trás da nomeação do novo chefe da Direção Nacional de Inteligência, o coronel da reserva Juan Carlos Liendo O’Connor, ex oficial de contato no Comando Sul do Pentágono, estreitamente ligado à ditadura de Alberto Fujimori e seu alter ego, Vladimiro Montesinos, ambos presos por delitos de lesa humanidade. Liendo garante a repressão e a militarização em curso no Peru, destaca Fascio.
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A impressionante rebelião do povo peruano, que o sociólogo e catedrático Héctor Bejar, nomeado chanceler nos primeiros dias do governo de Castillo, muito respeitado em toda a região e destituído rapidamente pela pressão do Parlamento, considerou que se trata de “uma autêntica sublevação popular” a que se uniram estudantes de várias universidades do país, diante do que o exército peruano, treinado há anos pelos Estados Unidos, está agindo para eliminar “a subversão, combater (supostamente) o tráfico de drogas e o terrorismo” a que se acrescenta o “comunismo”.
De acordo com altos oficiais, em declarações aos meios de comunicação, estão “trabalhando intensamente” para combater o terrorismo, que segundo eles está por trás destas manifestações populares de camponeses, trabalhadores, sindicalistas, comunidades, mineiros e outros.
O mais grave é que a instrução aos meios de comunicação e às redes que também estão sob o controle dos Estados Unidos está destinada a aterrorizar o povo peruano, com o suposto combate “aos remanescentes do terrorismo”. O povo já sabe o que isto significa, lembram-se do que viveram, e continuam chorando mortos e desaparecidos ao longo dos últimos anos. Mas há setores da população que ainda se aterrorizam com o que escrevem os meios da desinformação.
Os peruanos se preparam para sofrer uma perseguição política feroz por parte das forças armadas e policiais que declararam a “guerra antiterrorista” com apoio do “parlamento”, da justiça e dos meios de comunicação, locais e estrangeiros.
Bases militares
Atualmente existem mais de 10 bases militares estadunidenses em todo o território peruano, instaladas em terrenos particulares, em bases militares ou da marinha de guerra peruana. Estão localizadas em postos estratégicos de energia. Entre as bases militares mais conhecidas cita-se:1- Palmapampa (no VRAEM.) 2. Mazamari – VRAEM.3. Pichari – VRAEM.4. Porto de El Callao.5. Ancón. Pucalpa.7. Equitos.8. Teniente Clavero 9 Putumayo, Santa Clotilde – Loreto 10.
O VRAEM sitúa-se em uma zona de vales encabeçados por Apurimac e outros, lugar estratégico para os exercícios militares e zona de bases. Também foi denunciada a existência do laboratório da Marinha dos Estados Unidos, chamado NAMRU-6, com instalações em Lima e Iquitos, para supostamente investigar enfermidades infecciosas. Isto foi denunciado por numerosas organizações. A midia cita o congressista Richard Arce que apresentou um questionário ao Ministério da Defesa dos Estados Unidos a que ninguém respondeu.
América Latina cercada por Estados Unidos através de suas 76 bases militares
O analista peruano Ricardo Soberón garante que este Laboratorio (NAMRU-6) estabelecido pela Marinha dos Estados Unidos no Peru desde 1983, levanta uma série de dúvidas, observações sobre seu funcionamento e atividade.
Soberón adverte que a tecnologia bélica do século XXI “é acompanhada pelo desenvolvimento de agentes patológicos, endêmicos e agentes químicos e biológicos que são utilizados com fins militares. Vimos isso em diferentes cenários recentes. Tendo isso em consideração é que “chama muito a atenção que tenha sido construído um estabelecimento de medicina tropical que trabalha con níveis de biosegurança 3, reconhecidos no uso de agentes patógenos”.
Acrescenta que, de acordo “com as perguntas que o Congressista Richard Arce fez ao Ministério da Defesa, entendemos que a Marinha de Guerra do Peru é a contrapartida da Marinha norte-americana no estabelecimento deste complexo dentro do Hospital Naval peruano. “As dúvidas que tivemos com as perguntas do Congressista Arce, que não foram respondidas, referem-se basicamente aos papéis, às autonomias, às competências que têm as duas partes em território peruano e como se realizam os resultados obtidos nas pesquisas em matéria de doenças tropicais”.
Analisa ainda que “efetivamente, tratando-se de um mecanismo estritamente militar o fato de que haja pessoal militar norte-americano nos deve levar a duas perguntas: 1- A que jurisdição obedecem, tem status diplomático? 2- Ao estar servindo dentro de uma instalação militar peruana, a cadeia de comando está dirigida para seu militar de contato ou para os militares peruanos? Por último, e essa pergunta tampouco foi respondida: que certeza têm os militares peruanos de que os resultados das pesquisas não terão fins militares?” (Artigo publicado na Revista O Direito de Viver em Paz N°14).
Stella Calloni | Jornalista e colaboradora da Diálogos do Sul em Buenos Aires.
Tradução: Ana Corbisier.
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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