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Jornalista russa brutalmente agredida na Chechênia foi atacada no mesmo país em 2020

Espacamento de Yelena Milashina e do advogado Aleksandr Nemov provasvelmente foram provocações ocidentais
Juan Pablo Duch
La Jornada
Moscou

Tradução:

A jornalista investigativa russa Yelena Milashina, uma das mais respeitadas jornalistas de Novaya Gazeta, e o advogado Aleksandr Nemov, sofreram nesta terça-feira (4) uma brutal agressão na Chechênia.

Um grupo de homens armados interceptou o táxi que os levava do aeroporto de Vladikavkaz à cidade de Grozni, onde um tribunal tinha previsto ditar sentença no julgamento contra Zarema Musayeva, defendida por Nemov, denunciou na Internet o agora ilegalizado periódico que é dirigido pelo prêmio Nobel da Paz. Dimitri Muratov.

Tirados do veículo à força, os agressores mascarados golpearam com tubos de polietileno de alta densidade Milashina e Nemov e, quando caíram no chão, lhes deram chutes na cabeça e no rosto. Os puseram ajoelhados, com uma pistola na cabeça, enquanto o cabeça do grupo lhes gritava: “Sumam daqui. Lhes advertimos que não viessem e não se atrevam a escrever nada”, detalhou o meio de comunicação onde trabalha a jornalista em uma declaração, difundida através de sua página web.

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A Equipe contra a Tortura – o novo nome da proscrita ONG conhecida antes como Comitê contra a Tortura –, publicou com seu consentimento fotografias de Milashina e Nemov em um hospital de Grozni, onde foram internados à espera de que um avião-ambulância chegasse da capital russa, com um grupo de médicos, para transferi-los ao hospital Botkin de Moscou. 

Segundo o diretor desta ONG, Serguei Babinets, que os visitou no hospital, o estado de ambos é delicado e os agressores se ensanharam com a jornalista, que desmaiou várias vezes e tem comoção cerebral e vários dedos das mãos quebrados. A rasparam e lhe roçaram o rosto com um antisséptico de cor verde, que por alguma razão se tornou o máximo símbolo da humilhação na Rússia.  

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Nemov, continuou Babinets em seu canal de Telegram, sofreu uma ferida com arma branca no pé e a ambos lhe tiraram os telefones celulares, que exigiram desbloquear para ver seu conteúdo, e computadores portáteis, destruindo todos os documentos que levavam com eles. 

Muratov solicitou a intervenção de Tatiana Moskalkova, comissionada para os direitos humanos, instância que depende do Kremlin, a qual falou por telefone com Milashina e prometeu que a agressão será investigada de maneira “exaustiva” e os “agressores serão castigados”. 

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Por sua parte, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, disse que o presidente Vladimir Putin já havia sido informado do ataque a Milashina e Nemov. O representante russo o qualificou de “muito sério”, que, sem dúvida, requer que se tomem “enérgicas medidas” e que se faça “uma investigação a fundo”.

Espacamento de Yelena Milashina e do advogado Aleksandr Nemov provasvelmente foram provocações ocidentais

Milashina dá continuidade ao trabalho jornalístico realizado pela companheira de redação Anna Politkovskaya, assassinada em 2006

Reação chechena

O governante checheno, Ramzan Kadyrov, declarou em sua conta no Telegram: “Vamos esclarecer o caso. Dei instruções aos serviços de segurança a fazer o máximo esforço para identificar os agressores. Começaram a trabalhar logo que se conheceu a notícia do ataque”. 

O diretor da filial do Comitê de Instrução da Rússia na Chechênia, Vitali Volkov, também recebeu de Moscou a ordem de seu presidente, Aleksandr Bastrykin, de investigar a agressão. 

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Continuadora do trabalho jornalístico que realizava sua companheira de redação Anna Politkovskaya, assassinada em Moscou em 2006 por um sicário checheno sem que se saiba ainda o nome do autor intelectual desse crime, Milashina teve que abandonar a Rússia em fevereiro de 2022 pelas ameaças recebidas das autoridades da Chechênia.

Não é a primeira vez que atacam a Milashina nessa república do Cáucaso do Norte. Em fevereiro de 2020, em companhia da advogada Marina Dubrovina, ao chegar ao seu hotel em Grozny, para onde viajou para cobrir vários julgamentos, foram abordadas por 15 pessoas que as insultaram e acabaram dando-lhes uma surra, recordam as agências noticiosas internacionais. 

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Apesar do elevado risco que implicava, empenhou-se a acompanhar Nemov nesta viagem para contar a enorme injustiça que, em sua opinião, se está cometendo com Zarema Musayeva, esposa o ex-juiz retirado Said Yangulbayev e mãe de três filhos, dois dos quais, Abubakar e Ibrahim, ativistas dos direitos humanos, se declararam abertos opositores do governo de Ramzan Kadyrov na Chechênia.

Em janeiro de 2022, policiais chechenos irromperam no apartamento da família Yangulbayev na cidade russa de Ninzhny Novgorode. Ao não encontrarem nem o pai nem os filhos, levaram a mãe, uma mulher doente de diabetes que, de acordo com a ONG Memorial, também merecedora do Prêmio Nobel da Paz e já proibida na Rússia, se converteu “em uma espécie de refém e prisioneira política”. 

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O próprio Kadyrov afirmou que “a sua polícia só queria interrogar” Musayeva sobre uma estada que cometeu em 2019 uma tal Madina Azimova, mas aquele negou conhecer uma pessoa com esse nome. O governante checheno indicou que ela se lançou contra o escrivão que estava redigindo a ata e “quase lhe tira um olho”, razão pela qual a testemunha tornou-se imputada. 

Após acusá-la do papel de cúmplice do delito de estafa, um ano e meio depois de permanecer atrás das grades, uma corte chechena condenou Musayeva nesta terça-feira (4) a cinco anos e meio de privação de liberdade. 

Nem Milashina nem Nemov puderam assistir a sessão final do julgamento contra Musayeva.

Serguei Shoigu fala sobre motim

O ministro de Defesa russo, Serguei Shoigu, se pronunciou sobre a insurreição do grupo de mercenários Wagner – até poucos dias atrás chefiado pelo magnata Yevgueni Prigozhin – que pediam sua destituição e a do chefe do Estado Maior, Valeri Guerasimov.

“Esses planos fracassaram em primeiro lugar porque o pessoal das forças armadas mostrou seu apego ao juramento de lealdade e do dever militar. A provocação não influiu nas ações dos grupos de tropas. Os militares, com valentia e determinação, continuaram cumprindo as tarefas que lhes foi encomendada”, afirmou Shoigu nesta segunda-feira (3) em uma reunião com militares russos, de acordo com a agência de notícias oficial TASS. 

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Também nesta segunda-feira, Prigozhin afirmou: “Quero que todos entendam: nossa ‘marcha pela justiça’ pretendia lutar contra os traidores e mobilizar nossa sociedade. E creio que pudemos conseguir muito disso”, apontou através do Grey Zona, um canal de notícias no Telegram próximo aos Wagner. 

“Hoje necessitamos de seu apoio como nunca. E agradeço por isso. Logo vão ver nossos novos triunfos na frente de batalha”, prometeu e se despediu com um novo agradecimento àqueles que simpatizaram com sua tentativa de rebelião: “Obrigado, rapazes”; 

Fracasso dos Wagner e da Ucrânia aponta lealdade de militares e políticos russos a Putin

A partir do momento em que ordenou aos seus mercenários deter o avanço para Moscou em 23 de junho, faltando 200 quilômetros para chegar à capital russa desde Rostov do Don, Prigozhin só havia difundido uma breve mensagem no qual assegurou que não tinha a intenção de derrocar o presidente Vladimir Putin.

Shoigu e Prigozhin voltaram a aparecer na cena pública para deixar constância de seus diametralmente opostos pontos de vista. Já é oficial que o ministério da Defesa rescindiu o contrato de fornecimento de alimentos para o exército que, em só um ano, nas palavras de Putin, representou um enorme gasto do orçamento federal, um duro golpe para os ingressos do magnata.

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Em Vesti Nedieli (Notícias da semana), o dominical programa estelar do canal Rossiya-1, o apresentador Dimitri Kisiliov assegurou que o grupo Wagner e o consórcio Konkord, ambos propriedade de Prigozhin, “em total, se beneficiaram com contratos do Estados por um valor de um bilhão e 700 mil rublos – há alguns dias, ele não poupou elogios para descrever “a façanha do grupo Wagner” que, finalmente, após oito meses de cotidianos ataques, “conquistou a estratégica cidade de Bakhmut” em ruínas, e agora diz que “na realidade, dominar Bakhmut não é tão importante no conjunto da frente da batalha”.

Kisiliov não especificou de onde tirou a cifra sobre os contratos nem a que período se referia, limitando-se a dizer que “não é o que embolsou (Prigozhin), mas dá uma ideia do volume de seus negócios e de suas ambições desmedidas”. 

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Para forçá-lo a vender barato, presumivelmente ao magnata Yuri Kovalchuk, muito próximo a Putin, as autoridades russas bloquearam, uma vez fracassada a rebelião, o acesso a quase todos os recursos midiáticos vinculados a Prigozhin. 

Nessas condições, e nas palavras do seu braço direito em matéria de meios, Yevgueni Zubariev, o diretor-geral do Patriot, Priogozhin, no melhor estilo de Lope de Veja, comportou-se como o cão do hortelão e recusou vender seu empório midiático.

Armas, soldados, meios de comunicação: Prigozhin perde bens após motim fracassado

Em um vídeo difundido nas redes sociais, no sábado anterior, Zubariev anunciou: “Tomamos a decisão de fechar todos os meios do Patriot e sair do espaço informativo da Rússia”. 

Zubariev precisou que isto se refere à Agência de Investigação de Internet (como se chama agora a fábrica de trolls), a Agência Federal de Notícias, numerosas páginas web, canais no Telegram e outras redes sociais, assim como os blogueiros que reproduziam seus conteúdos. Clausurou uma incipiente rede social própria. 

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No segmento russo das redes sociais circulam não poucos testemunhos de empregados do holding de meios Patriot – chegou a ter 16 mil – que se queixam não só de ter perdido o trabalho da noite para o dia, mas que não receberam nenhuma compensação. 

O grupo Wagner anunciou no domingo que “suspendeu temporariamente” o funcionamento de seus centros de recrutamento durante um mês devido à “não participação temporária na campanha militar (na Ucrânia) e seu translado à Bielorrússia”.

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No entanto, ainda na segunda-feira, o canal do grupo Wagner no Telegram ofereceu um salário “a partir de 240.000 rublos (R$ 12860,00) mais subsídios” a qualquer pessoa que quisesse se alistar como “combatente de unidades de assalto” simplesmente ligando para os números de telefone que operam em 39 entidades da Federação Russa..

Juan Pablo Duch | Correspondente de La Jornada em Moscou.

Tradução Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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Juan Pablo Duch Correspondente do La Jornada em Moscou.

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