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Luta contra exploração, medo da marginalidade e a proibição da prostituição na Espanha

Segundo governo espanhol, mais de 90% das mulheres que exercem a prostituição o fazem obrigadas; profissionais, em contrapartida, discordam
Armando G. Tejeda
La Jornada
Madri

Tradução:

A poucos dias da entrada em vigor da proibição da prostituição na Espanha, a maioria das trabalhadoras sexuais, que segundo se estima são 45 mil, continuam exercendo-a, embora com “mais incerteza e temores” porque, além de exigir aos dirigentes políticos que as escutem, também pedem que se intensifique a luta contra as máfias da exploração sexual. 

Vanessa estuda enfermagem, tem 24 anos e se declara abertamente acompanhante ou prostituta. “Eu o faço livremente, ninguém me obriga e o faço por necessidade, porque o dinheiro não basta para mim, mas não estou sob as ordens de ninguém nem nenhuma rede de exploração sexual. É um trabalho mais que me serve para viver”, relatou ao La Jornada, depois de reconhecer que com a entrada em vigor da nova lei que proíbe a prostituição na Espanha “a única coisa que mudou é que agora trabalhamos com mais medo e incerteza”. 

É uma visão que está na antípoda do governo espanhol, presidido pelo socialista Pedro Sánchez, que impulsionou a nova legislação com a intenção de fazer desaparecer da sociedade qualquer tipo de prostituição e na qual se incluem penas para os clientes e cafetões de três a seis anos de prisão e multa de milhares de euros, sob o argumento de que “qualquer país democrático não pode permitir estas atividades”.

Segundo governo espanhol, mais de 90% das mulheres que exercem a prostituição o fazem obrigadas; profissionais, em contrapartida, discordam

plataformamulheres.org.pt
“Espanha é o primeiro país europeu em consumo de prostituição", afirma a ministra de Justiça espanhola, Pilar Llop




Legislação mais taxativa

Os dirigente políticos espanhóis optaram pela legislação mais taxativa contra a prostituição para acabar com uma “indústria” na qual trabalham habitualmente mais de 45 mil mulheres e que dá trabalho a mais de 120 mil pessoas, o que supõe em dinheiro uns quatro bilhões de euros anuais.

O problema principal, aos olhos do governo e dos grupos parlamentares que respaldaram a lei, entre eles o Partido Socialista Obrero Espanhol, Unidas Podemos e o direitista Partido Popular é que, segundo os dados da Promotoria Geral do Estado, as mulheres que trabalham neste setor, entre 90 a 95%” o fazem obrigadas ou escravizadas. Se esse dado fosse certo, suporia que na Espanha há mais de 40 mil mulheres exploradas sexualmente.

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Esse foi o argumento esgrimido por mais de uma centena de associações feministas para exigir ao governo e à classe política que aprovasse uma lei “abolicionista do sistema de prostituição”, ao argumentar que “qualquer tipo de prostituição não é um trabalho, mas exploração sexual”.


Plataforma Estatal versus Stop Abolition

As associações feministas criaram a Plataforma Estatal para a Abolição da Prostituição, cuja presidenta, Rosario Carracedo, explicou que seu projeto tem três fases: proteger e oferecer reparação às “vítimas de violência na prostituição”, isto é, a todas as mulheres que exercem essa atividade; “desativar o proxenetismo” e “desativar a demanda”. 

No entanto, na medida em que a lei vai superando os trâmites parlamentares, as e os trabalhadores envolvidos nessa atividade realizaram diversos atos de protesto, para reclamar que em lugar de uma lei que chamaram de “proibicionista”, se trabalhe em “uma legislação que lhes converta em cidadãos de pleno direito”. 

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Susana Pastor, presidenta da plataforma de prostitutas Stop abolition, explicou: “Somos uma plataforma pacifista e apolítica integrada majoritariamente por trabalhadoras sexuais, mulheres que decidimos livremente exercer um trabalho cuja dignidade defendemos. Apesar do estigma de sermos identificadas, decidimos defender nossos direitos. Somos mulheres independentes e não necessitamos da tutela paternalista de ninguém para decidir sobre nosso corpo e nossa forma de ganhar nosso pão e o de nossas famílias (…) Consideramos que a penalização do trabalho sexual é uma limitação de nossa liberdade como mulheres e de todas as pessoas cis e trans que nos dedicamos a essa atividade. Uma estigmatização inaceitável para aquelas pessoas que queremos exercer livremente. Também para os homens e mulheres com aqueles que acertamos nossos serviços”.


“Consumismo” sexual

A ministra de Justiça espanhola, Pilar Llop, defende o espírito de lei porque a “Espanha é o primeiro país europeu em consumo de prostituição. Porque o que pretendemos com a lei abolicionista é combater todas as formas de proxenetismo. Até agora o punitivo era a exploração sexual, mas é um conceito que exige uma interpretação e determinadas condições na vítima e o que queremos é que se vá à raiz da prostituição e eliminar qualquer tipo de proxenetismo. Os tribunais também terão que elaborar jurisprudência sobre isto. A finalidade é erradicar a prostituição, porque o que ela faz é perpetuar o machismo. Que haja um sexo que possa consumir os corpos de outras pessoas, o que isso faz é posicionar os sexos em uma situação de desequilíbrio que não cabe numa sociedade democrática”. 

Vanessa, de origem andaluza e que vive em Barcelona, afirma que “Em qualquer caso vou continuar fazendo enquanto haja fórmulas, não creio que vão mandar polícias a todos os centros noturnos, apartamentos de garotas e à rua para impedir que façamos nosso trabalho”.

A partir da Plataforma Stop Abolition, reclamam ao governo e aos dois partidos no poder a reconsiderarem uma lei que no seu entender suporá “a total clandestinidade de fato do trabalho sexual e uma legislação baseada em um neopuritanismo moral baseadas em argumentos falhos e estatísticas falsas. É mentira que 80 ou 90% das trabalhadoras sexuais estejamos obrigadas”.

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Isso contrasta com o que diz o governo, que reafirma que mais de 90% das mulheres que exercem a prostituição o fazem obrigadas, apesar de ser difícil a “obtenção de dados fiáveis por serem delitos com estruturas delitivas complexas e nos quais as vítimas, devido à sua vulnerabilidade, desconfiam das autoridades e têm reticência a denunciar ou colaborar”.


Cifras

Segundo cifras do ministério do Interior, entre os anos 2016 e 2020 foram detectadas umas 3.800 pessoas em situação de risco, das quais 575 foram declaradas vítimas de tráfico, o que derivou na detenção por exploração sexual de 172 pessoas. Cifras muito diferentes das supostas 40 mil mulheres que trabalham obrigadas no exercício da prostituição. 

Pastor, da Plataforma Stop Abolition, disse estar a favor da regulação da Lei de Estrangeria para garantir os direitos civis de muitas mulheres de origem estrangeira, e de perseguir as máfias que coagem as mulheres, mas advertiu que, pelas experiências em outros países, a proibição do trabalho sexual nos deixará na marginalidade, gerando insegurança para todas, falta de proteção sanitária e desamparo social”.

Armado G. Tejeda | Correspondente do La Jornada em Madri.
Tradução: Beatriz cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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Armando G. Tejeda Mestre em Jornalismo pela Jornalismo na Universidade Autónoma de Madrid, foi colaborador do jornal El País, na seção Economia e Sociedade. Atualmente é correspondente do La Jornada na Espanha e membro do conselho editorial da revista Babab.

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