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Greves nos EUA: Povo trabalhador sabe que foi excluído do sonho americano, diz especialista

Ainda segundo o professor de Estudos Trabalhistas Eric Blanc, percepção tem encorajado estadunidenses a se sindicalizarem e aderirem a greves
David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

O indicador mais recente de uma onda de militância e mobilização sindical sem precedentes nas últimas décadas está sendo registrado nesta semana, quando cerca de 150 mil trabalhadores da indústria automobilística votam para autorizar uma greve. A paralisação se dará se Ford, General Motors e Stellantis não concordarem com um novo contrato coletivo em setembro. O movimento se soma a um verão que incluiu um triunfo histórico de 340 mil trabalhadores de embalagens e greves de milhares de atores e roteiristas de cinema e televisão, hoteleiros em Los Angeles e greves em mais de 150 lojas da Starbucks em demanda por contratos coletivos.

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O mês de julho foi o mais ativo em greves, ações e triunfos trabalhistas em três décadas, informa a Bloomberg.

“Os níveis de aprovação pró-sindical na opinião pública estão mais altos do que em qualquer momento em décadas”, explica Eric Blanc, professor de Estudos Trabalhistas da Universidade Rutgers, em Nova Jersey. Em entrevista ao La Jornada, Blanc acrescenta que “há uma percepção generalizada de que o povo trabalhador foi excluído do sonho americano e que as empresas e os multimilionários estão obtendo lucros sem precedentes enquanto todos os demais estão lutando para sobreviver. O apoio público é tão avassalador que está encorajando trabalhadores a sindicalizarem-se e sindicatos a atreverem-se a decretar greves”.

Kent Wong, diretor do Centro Laboral da Universidade da Califórnia em Los Angeles, disse ao La Jornada que “foi um verão dramático de greves e mobilização trabalhista”. Ele indica entre outros fatores novas lideranças e estratégias defendendo alianças comunitárias, mobilização trabalhista e mais esforços organizativos por uma ampla gama de sindicatos, incluindo o Service Employees International Union, de trabalhadores de serviços, o American Federation of Teachers, de professores, os automobilísticos do UAW, os transportistas do sindicato Teamsters, o de sobrecargas Association of Flight Attendants, como também a central operária AFL-CIO.

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Blanc e Wong reconhecem que o impacto da inflação sobre salários, a taxa baixíssima de desemprego e os informes de Wall Street registrando níveis recorde de rendas multimilionárias para os altos executivos empresariais estão abastecendo esta nova onda de militância trabalhadora.

Mas talvez o fator mais importante seja a nova pressão das bases dos sindicatos por lideranças mais dinâmicas e militantes, e para estratégias mais amplas que vão além das demandas imediatas em uma fábrica ou escritório. “A nova geração de trabalhadores jovens e, em particular, de trabalhadores progressistas que se radicalizaram pelas campanhas do senador socialista Bernie Sanders e de movimentos recentes como Black Lives Matter, desempenharam um papel maior em jogar desde as bases para a esquerda o movimento operário”, diz Blanc. “As ações trabalhistas mais importantes nos anos recentes foram impulsionadas mais por trabalhadores da base do que pelos líderes sindicais. Isto pode ser visto desde as greves de professores de 2018, como agora nos esforços de sindicalização na Starbucks e Amazon”.

Ainda segundo o professor de Estudos Trabalhistas Eric Blanc, percepção tem encorajado estadunidenses a se sindicalizarem e aderirem a greves

Foto: SAG-AFTRA/Twitter
Blanc: "Nível de autoritarismo dos patrões onde se trabalha é tão alto que intimida os trabalhadores"

No sindicato Teamsters, que obteve um novo contrato coletivo neste verão que incluiu aumentos salariais e benefícios negados por anos, o reformista Sean O’Brien foi eleito presidente em 2021, derrotando James Hoffa Jr., que ocupara o posto por mais de duas décadas e cujo pai, o lendário Jimmy Hoffa, o ocupara durante 17 anos antes de seu misterioso desaparecimento em que se suspeita da mão da máfia. Ao preparar-se para o confronto com a UPS neste verão, O’Brien instruiu seus membros a reunirem-se nas portas dos centros de trabalho para “ensaiar” a greve, buscou alianças para este esforço com outros sindicatos, organizações comunitárias e algumas organizações políticas, como o Democratic Socialists of America, para assegurar expressões de apoio se a greve ocorresse.

A empresa entendeu as dimensões da resistência e cedeu dias antes do programado para a grande greve em escala nacional, concordando com um contrato que eleva a 50 dólares por hora os salários dos choferes de nível máximo, novos benefícios incluindo a demanda de ar condicionado nos caminhões e eliminando o sobre-tempo obrigatório para a maioria dos trabalhadores.

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No sindicato automotriz UAW, a mudança interna do sindicato culminou com a eleição de Shawn Fain, o primeiro presidente eleito pelo voto direto dos agremiados – no passado, a prática era que só os delegados em uma convenção poderiam votar sobre a liderança. A democratização desse sindicato também foi nutrida pela ira gerada por escândalos de corrupção de mais de uma dezena de dirigentes nacionais. Com a nova liderança, está demandando às três grandes empresas automotrizes aumentos salariais de 40%, sindicalização de novas fábricas de automóveis elétricos e melhores benefícios de aposentadoria.

Em suas preparações para uma possível greve contra as três empresas automotrizes, Fain convocou comícios em frente a várias fábricas, construindo o apoio de outros sindicatos e organizações progressistas e armando um fundo de greve com 835 milhões de dólares que pagará aos trabalhadores cerca de 500 dólares por semana durante a greve.

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“Se haverá ou não uma greve no próximo mês, depende exclusivamente das três grandes fábricas de automóveis”, declarou Fain em meados deste mês. “Nossas prioridades estão claras, as empresas podem pagá-las, e há tempo mais do que suficiente para que as três grandes levem a sério estas negociações”.

A raiz do problema

Apesar destes atos de militância mais intensa, nada disso é fácil em um país sem plenos direitos trabalhistas. O professor Blanc afirma que “a razão pela qual não há ainda mais ações sindicais é a insegurança do emprego; o nível de autoritarismo dos patrões onde se trabalha é tão alto que intimida os trabalhadores”, e ressalta que “os direitos sindicais existem no papel nos Estados Unidos, mas as consequências de violar as leis trabalhistas são tão mínimas que as empresas sistematicamente violam a lei”.

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O especialista relata que centenas de trabalhadores jovens da Starbucks que se sindicalizaram foram demitidos pela empresa, enquanto os trabalhadores que recusam se sindicalizar recebem aumentos salariais. “Tudo isso é ilegal, mas a Starbucks o faz de toda maneira porque o custo de aceitar um sindicato é maior do que o custo de um pouco de imprensa negativa ou eventualmente pagar algo aos trabalhadores se o governo manda”, comenta.

Entre o que necessitam os trabalhadores estadunidenses estão exemplos em outros países, garante Blanc. “O que poderiam fazer trabalhadores e progressistas mexicanos é estabelecer um exemplo para demonstrar o que pode ocorrer quando um governo realmente faz cumprir os direitos trabalhistas. Isso seria um grande apoio para organizadores nos Estados Unidos, para que possam dizer, vejam, nosso vizinho faz cumprir os direitos trabalhistas, e vejam o que acontece: os trabalhadores perdem o medo de se sindicalizar, os salários sobem, as empresas já não podem unilateralmente violar a lei”.

David Brooks e Jim Cason | La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.
Tradução: Ana Corbisier


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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