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Texas, EUA: um caldo de racismo, armas e jogos políticos onde imigrantes são inimigos

A retórica que qualifica imigrantes como criminosos não é nova para os republicanos, mas tem ganhado cada vez mais força e perigo no estado texano
David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

O homem de 33 anos que assassinou oito pessoas em um centro comercial na periferia de Dallas tinha uma etiqueta no peito que dizia “RWDS” – sigla que segundo as autoridades são a frase “esquadrão de morte da ala direita”, que é um símbolo popular entre setores da ultradireita.

Depois dessa matança em Dallas, do ainda pouco claro caso de atropelamento de migrantes em Brownsville e das palavras inflamatórias do governador e outros políticos, o estado do Texas é um caldo perigoso de armas, racismo e xenofobia e jogos político-eleitorais com os imigrantes como o inimigo. 

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O autor do tiroteio nos subúrbios de Dallas, Mauricio Garcia, foi ligado a um site onde foram identificados escritos elogiando Hitler e vínculos a outros sites neonazistas. O perfil inclui uma imagem do centro comercial e as horas de maior atividade.

Segundo o New York Times, “o autor dos escritos sugere várias vezes que é de origem hispânica – em algum ponto indicando que é de origem mexicana”. Entre o que escreveu estava uma frase aparentemente explicando como um latino podia ser um supremacista branco: “os brancos e os hispanos têm muito em comum”.  

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Uma das vozes mais perigosas nesta conjuntura é a do governador do Texas, o republicano Greg Abbott, que foi um feroz crítico dos esforços do governo de Joe Biden para controlar a fronteira.

Em resposta ao anúncio da Casa Branca de enviar 1.500 militares para reforçar a fronteira, Abbott declarou no domingo que “não necessitamos 1.500 soldados, necessitamos 15 mil ou 150 mil para assegurar a fronteira como resultado das políticas de fronteira aberta do governo de Biden”.

A retórica que qualifica imigrantes como criminosos não é nova para os republicanos, mas tem ganhado cada vez mais força e perigo no estado texano

Patrick Feller/Flickr
Estadunidenses vendem materiais pró-Trump em rodovias do Texas, durante campanha eleitoral




Mobilização

Nesta segunda-feira (8), Abbott declarou que está mobilizando “forças táticas fronteiriças do Texas”, uma nova unidade da Guarda Nacional especialmente treinada para pontos “quentes” ao longo da fronteira, assim como helicópteros Black Hawk e aviões C-130.

Isto depois que um amplo coro de republicanos no Texas e no nível nacional continuam declarando que há “uma invasão” de migrantes na fronteira sul que buscam utilizar o fim do chamado Título 42 nesta quinta-feira (11) para intensificar os temores de um caos na fronteira. Em torno a isto, a bancada republicana da câmara baixa do Congresso federal tem a intenção de votar para aprovar um projeto de lei que busca ampliar o muro fronteiriço, pôr fim ao direito de asilo, e ampliar as detenções em massa. 

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Neste clima e com vocabulário alarmista, se nutre cada vez mais o fervor anti-imigrantes no Texas. “As palavras importam, as palavras têm consequências”, declarou Adam Isacson, do Washington Office on Latin America. “Não há ‘uma invasão’, não estamos ‘perdendo nosso país’…”, agregou.


Retórica

A retórica que qualifica de “invasores” e “criminosos” os imigrantes não é nada nova para os republicanos, o que chegou aos seus níveis máximos sob o governo de Donald Trump.  Agora se repete o mesmo roteiro outra vez com a estratégia eleitoral dos republicanos de usar a migração e a fronteira como tema central no ciclo eleitoral que culminará em novembro de 2024.  

Não se descarta a possibilidade de que o próprio Abbott decida concorrer como candidato presidencial. Abbott, como parte de sua campanha eleitoral para governador em 2022, tinha publicidade na televisão advertindo sobre a “invasão” dos estrangeiros ilegais, e seu subgovernador, Dan Patrick, comparou os cruzamentos ilegais da fronteira ao ataque japonês sobre Pearl Harbor que levou os Estados Unidos a entrar na Segunda Guerra Mundial.

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No Texas, essa retórica está armada. Mais armas de fogo são compradas no Texas do que em qualquer outro estado da união americana, e um número excepcional dos tiroteios massivos ocorreram nesse estado.


Desinteresse

A liderança política do Texas deixou evidente que, mesmo depois de cada tiroteio em massa, não tem nenhum interesse no controle de armas de fogo. De fato, nesses últimos dois anos, anularam o requisito de ter uma permissão estatal para obter uma arma de fogo e reduziram a idade para comprar armas de 21 anos para 18. 

Não obstante, o legislador estadual democrata que representa o povo de Uvalde, onde 19 crianças foram assassinadas à bala em uma escola primária no ano passado por um jovem, continuou insistindo em promover legislação para o controle de armas. O líder republicano no Senado estadual do Texas informou ao legislador democrata que tem que parar de apresentar o tema de controle de armas ou enfrentará uma proibição de falar dentro do Congresso estadual, reportou o New York Times esta semana.

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Agora todo incidente violento, inclusive possíveis acidentes, que ocorrem no Texas sempre têm que ser avaliados para detectar se houve ou não uma motivação racial ou xenofóbica. Neste ambiente, no domingo um condutor não respeitou um semáforo vermelho e atropelou várias pessoas sentadas em uma banqueta no lado de fora de um albergue de migrantes, matando oito e ferindo 12, na cidade fronteiriça de Brownsville, e a polícia ainda investiga se “foi intencional” ou não.


Histórico de violência

Talvez o incidente mais violento contra latinos no Texas foi o tiroteio massivo em 2019 em um Walmart de El Paso, onde um jovem armado matou 23 pessoas – incluindo mexicanos – no que é um dos maiores tiroteios massivos da história do país.

O jovem de 24 anos havia avisado nos meios sociais que tinha a intenção de matar em resposta à “invasão hispana” do Texas. Em fevereiro deste ano, ele se declarou culpado de cometer “crimes de ódio”. Mais de três anos depois, essa retórica anti-imigrantes só se intensifica no Texas. 

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“Há uma necessidade urgente de que aqueles com poder e megafones parem imediatamente de usar sua retórica desumanizadora e denunciem amplamente a invasão racista e anti-semita e as conspirações de substituição”, disse Vanessa Cardenas, diretora executiva da Organização Americana de Reforma da Imigração.

David Brooks e Jim Cason | La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.
Tradução: Beatriz Cannabrava.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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