Em 3 de maio, foi o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa e, com isso, os líderes políticos deste país expressaram, como é rotina, que essa liberdade é sagrada, embora pouco antes tivessem autorizado o envio de mais bombas feitas nos EUA que já foram utilizadas para matar mais jornalistas do que em qualquer outro episódio bélico. Além disso, persistem na perseguição e encarceramento de um jornalista que publicou documentos sobre, entre outras coisas, crimes de guerra de Washington em seus conflitos bélicos.
“A imprensa livre é um pilar essencial da democracia”, declarou Joe Biden, acrescentando que os jornalistas se esforçam para expor a corrupção, documentar guerras e que “alguns jornalistas deram suas vidas por esse trabalho”. Sublinhou que o jornalismo “não deve ser crime” em nenhum lugar e se atreveu a comentar que 2023 foi um dos anos mais mortíferos para jornalistas ao assinalar que “uma razão para isso é a guerra em Gaza, onde muitos jornalistas, a grande maioria deles palestinos, foram mortos” (mas evitou identificar quem os matou e menos ainda a assistência de seu governo para essa guerra). Também disse que os Estados Unidos exigem a libertação de todo jornalista preso no mundo por fazer seu trabalho (evitou mencionar Julian Assange).
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A organização Repórteres sem Fronteiras (RSF) calcula que mais de 100 jornalistas foram assassinados desde 7 de outubro em Gaza. “Esses 103 jornalistas não são números, são 103 vozes que Israel calou, são 103 testemunhas a menos da catástrofe que se desenvolve na Palestina”, denunciou Christophe Deloire, secretário-geral da RSF (o número subiu para 105 pouco depois).
O Comitê de Proteção aos Jornalistas registra 97 repórteres falecidos em Gaza e denunciou que “os jornalistas pagaram o custo mais alto – suas vidas – para defender nosso direito à verdade”. Tanto o Comitê como a RSF destacam que este tem sido o período mais mortífero para jornalistas em pelo menos 30 anos.
Al Jazeera
Enquanto os israelenses afirmam abertamente que não podem garantir a proteção de jornalistas em Gaza – e em 5 de maio anunciaram o fechamento da Al Jazeera em Israel por razões de segurança nacional, algo ainda não condenado por Washington –, suas forças lançam bombas ou disparam munições feitas e entregues pelos Estados Unidos que mataram mais de 34 mil civis, incluindo jornalistas e suas famílias.
Em casa, apesar das palavras bonitas de Biden e outros, os Estados Unidos caíram 10 posições no índice anual da RSF, a “Classificação Mundial da Liberdade de Imprensa 2024”, em comparação com 2023, ocupando agora o 55º lugar no mundo, uma classificação nada estelar para o auto proclamado campeão mundial da democracia. Embora tenham diminuído as violações e ameaças contra a imprensa que existiam durante o governo de Trump, que abertamente declarou os meios de comunicação como inimigo do povo – algo que continua repetindo –, o informe destaca que não foi resolvida uma série de problemas que ferem essa liberdade tanto a nível nacional como local, incluindo agressões contra jornalistas por políticos, bem como detenções de repórteres que cobriam protestos.
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A RSF e outros defensores da liberdade de imprensa continuam a denunciar a insistência do governo dos EUA em continuar com seus esforços para extraditar e julgar o fundador do Wikileaks, Julian Assange, reiterando ao suposto campeão da democracia que fazê-lo viola esse pilar da liberdade de imprensa.
Ao mesmo tempo, a maioria (2/3) dos estadunidenses acredita que a imprensa não tem plena liberdade para reportar as notícias e mais de 83% acreditam que a mídia opera sob influência de interesses financeiros ou políticos, segundo a Pew Research. “A liberdade de imprensa pertence ao homem que possui uma”, escreveu o jornalista AJ Liebling no The New Yorker em 1960.
Talvez os políticos devessem exercer o direito ao silêncio para evitar abusar de sua liberdade de expressão. “No nosso país, temos estas três coisas inevitavelmente preciosas: a liberdade de expressão, a liberdade de consciência e a prudência de não praticar nenhuma delas”, escreveu Mark Twain.
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