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ToggleA relação entre o Poder Executivo, civil, e os militares é, segundo a Constituição em vigor, um manda e outro obedece, salvo em casos em que o mandante viole a lei maior. A segurança do presidente, durante o governo dos militares, dito governo Bolsonaro, era responsabilidade do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), integrado e comandado por militares. Eram mais de 9 mil na Administração, por isso mesmo, um governo dos militares. Isso acabou com a eleição de um civil no pleito de 2022, mas o presidente civil não consegue desatar-se das amarras castrenses.
O GSI, controlado pelos militares, foi o pivô da conspiração golpista que culminou nos atos de vandalismo do dia 8 de janeiro. Ficou comprovado pelos filmes das câmeras de segurança e pelas conversas telefônicas entre os golpistas, a participação de toda a cadeia de comando, comprometendo as forças armadas como instituição.
Vitorioso no pleito, Luiz Inácio Lula da Silva, conhecendo esses fatos – o mundo conhece já esses fatos – não podia confiar sua segurança em militares que queriam sua deposição e até mesmo sua morte. Entregou sua segurança para a Polícia Federal, instituição civil cuja missão é precisamente garantir a segurança interna, já que as forças armadas, como instituição de Estado, se encarregam da segurança externa.
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Reorganizado o GSI, o ministro-chefe, general Amaro, reivindicou ter de volta a atribuição da segurança do presidente. Não há lei nem norma que sustente isso, só sua vontade. O ministro da Justiça, Flávio Dino, teve que mediar o conflito e surgiu com uma solução pacificadora: a Polícia Federal continua na segurança só que sob o comando do GSI, um organismo que ainda é dos militares e comandado por militar.
Uma bagunça homérica. Sinal de fraqueza. A questão militar não resolvida é o calcanhar de Aquiles deste governo. O GSI abriga a maior concentração de conspiradores. Deveria ser extinto, pois é uma criação dos governos militares. Tem que dissolver e criar outro, unicamente civil, como é no mundo dito democrático.
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino (Foto: José Cruz/Agência Brasil)
A sociedade tem que entender o papel constitucional dos militares e exigir dos poderes constituídos o cumprimento da Constituição
Tem que haver uma coordenação das inteligências e para isso foi criada a Abin – Agência Brasileira de Informação –, com função precípua de coordenar as Inteligências. As inteligências militares, das três armas, se destinam a vigiar os possíveis inimigos externos, informar sobre tensões que possam prejudicar a convivência pacífica.
Do jeito que está é uma aberração. Esse casamento entre PF e GSI militarizado não vai dar certo. O agente da PF não vai querer estar subordinado a um general cujos visão de mundo e conceito de segurança são completamente diferentes. O militar é treinado para abater o inimigo, o que não é o caso, não temos inimigo nos ameaçando. Para garantir a ordem interna foi criada a Força Nacional.
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O militar ainda se guia pela doutrina de segurança nacional, excrescência imposta pelos Estados Unidos nos tempos da guerra fria que tem como princípio a defesa do inimigo interno, o próprio povo. Uma doutrina que transformou as forças armadas em tropas pretorianos para garantir tranquilidade na colônia.
Isso tem que ser superado. Tem que ser revisto todos os acordos formais e informais entre as forças armadas e os Estados Unidos. Política externa independente se choca com a realidade de ser aliado dos Estados Unidos extra-Otan e integrar o comando sul desse país.
Não pode o governo ceder aos militares. Tem que dar as ordens e exigir obediência. A sociedade tem que entender o papel constitucional dos militares e exigir dos poderes constituídos, Executivo e Legislativo, o cumprimento da Constituição. Seguir à risca o que manda a Constituição de 88, é o único caminho viável para devolver os militares aos quartéis.
Tem que perder o medo. Os militares apostam no medo para impor suas prerrogativas e privilégios. Tem que perder o medo e, cumprindo com a Constituição e os regulamentos militares em vigência, punir os militares infratores. Impunes continuam conspirando, afrontando com arrogância as instituições.
Falta um conceito de segurança a regular as relações do poder civil com os militares, falta uma política de defesa para enquadrar o papel do militar. Segundo o professor Manuel Domingos, dever-se-ia convocar uma Conferência Nacional sobre Defesa, ou Segurança, para que toda a sociedade participe da elaboração de uma doutrina de defesa e sobre o papel das forças armadas.
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Narcoestado domina a Amazônia
Terra sem lei, o crime organizado ocupa a Amazônia. São 13 facções nacionais, – destaque para o PCC e CV –, 17 organizações estrangeiras, 12 grupos locais, atuando coordenadamente em todo tipo de ilícitos: tráfico de droga, de fauna e flora silvestre e até de gente, mineração ilegal, extração de madeira e pesca ilegal, ocupação de reservas indígenas, grilagem de terra, garimpo ilegal, poluição dos rios com mercúrio, cobrança de taxas.
Todas essas atividades se articulam como base logística e de lavagem de dinheiro para o tráfico de droga. 90% da cocaína consumida no mundo é procedente da Colômbia e 80% da cocaína comercializada passa pelo Brasil. Narcoestado brasileiro transformado no maior corredor de tráfico.
Criaram uma economia paralela, com estradas e aeroportos clandestinos, além das vias aquáticas, que funciona com a complacência do Estado, participação de instituições civis e militares e bancos. Envolve os países da tríplice fronteira Brasil-Peru-Colômbia e Bolívia.
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Reportagem do Estado de SP, de 28 de junho, com base no Relatório Mundial sobre Drogas 2023, do Escritório da ONU sobre Droga e Crime (Unodc, sigla em inglês), mostra a extrema degradação do ambiente, inclusive humano, com aumento da miséria e violência.
Tudo isso para atender a um mercado de mais de 300 milhões de pessoas. Segundo o relatório, são 219 milhões de consumidores de cannabis, 60 milhões de derivados do ópio, 36 milhões de anfetaminas, 22 milhões de cocaína e 20 milhões de êxtase.
A apreensão da cocaína nos portos brasileiros de 2015 a 2019 saltou de 5 toneladas por ano para 67 toneladas, representando 7% das apreensões globais. Na Amazônia, nesse mesmo período, a apreensão de 6 toneladas/ano foi para mais de 30.
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A produção da droga, que era de 1 mil toneladas em 2014, chegou a mais de 2 mil em 2020 e não para de crescer. Relatório da ONU registra que em 2022 a produção de cocaína aumentou 35%, resultado de melhores colheitas da folha de coca e mais facilidade de transformar o produto. Os maiores produtores são Colômbia (61%), Peru (26%) e Bolívia (13%).
O mercado brasileiro consome 100 toneladas/ano. Estados Unidos figuram como o maior mercado para a cocaína, com 30%, seguindo as Américas Central e do Sul, com 24%, Europa, com 21%, África, com 9%.
Paulo Cannabrava Filho, jornalista editor da Diálogos do Sul e escritor.
É autor de uma vintena de livros em vários idiomas, destacamos as seguintes produções:
• A Nova Roma – Como os Estados Unidos se transformam numa Washington Imperial através da exploração da fé religiosa – Appris Editora
• Resistência e Anistia – A História contada por seus protagonistas – Alameda Editorial
• Governabilidade Impossível – Reflexões sobre a partidocracia brasileira – Alameda Editora
• No Olho do Furacão, América Latina nos anos 1960-70 – Cortez Editora
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