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Cannabrava | Lula precisa de mais 6 mi de votos e só poderá governar com povo mobilizado

Com o Congresso mais reacionário e de extrema-direita de nossa história, para governo do PT dar certo, terá que concentrar todos os esforços na comunicação
Paulo Cannabrava Filho
Diálogos do Sul
São Paulo (SP)

Tradução:

Lula precisa de mais seis milhões de votos para ganhar, mas se ganhar governará com a direita mais reacionária. É o que mostram os resultados oficiais do Tribunal Superior Eleitoral. Foi um domingo de eleição dos mais tranquilos, salvo algumas filas em alguns colégios eleitorais.

O que se pode deduzir dos resultados é que o eleitorado é mais conservador do que se pensava e que as pesquisas não detectaram esse conservadorismo enrustido. Foi uma verdadeira avalanche da direita mais reacionária nas eleições para as duas casas do Legislativo

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Vamos adotar um critério para definir esquerda e direita. Necessário porque o que a mídia define como centro ou direita e mesmo esquerda, são todos do mesmo time. 

A direita é retrógrada, por uma simples razão: são minimalistas com relação ao Estado, adotam o pensamento único imposto pelo capital financeiro, o que significa ser desestatizante, privatizante e desnacionalizante, o que por sua vez, é ser pró imperialista, tais como PL, Novo, Republicanos, União, PP, PSD, PTB, PSC. 

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A esquerda é progressista porque é antineoliberal, o que significa ser desenvolvimentista, ou seja, colocar o Estado como indutor do desenvolvimento integral e sustentável. Nesse time estão as federações PT, PCdoB, PV e Psol, Rede. 

O Centro é passível de atuar como fiel da balança, ou seja, pode apoiar projetos de interesse nacional de acordo com as circunstâncias. Estão neste caso MDB, PSDB/Cidadania, Solidariedade, PSB, PDT, Pros. Vemos isso em detalhe mais adiante.


Os números para presidente

Eleitores aptos a votar são 156 milhões. A abstenção foi altíssima, 20,94%, ou 32,7 milhões; nulos e brancos 4,31%, ou 5,4 milhões, o que resultou em 125 milhões de votos válidos. Mantendo esses números, ganha a eleição quem conquistar 63 milhões de votos. 

Abstenções, assim como votos nulos e brancos ajudam à manutenção do status quo e comprometem a legitimidade da eleição. É muita gente. Os partidos precisam refletir sobre isso.

Lula teve 48,40% ou 57,1 milhões, Bolsonaro 43,22% ou 51 milhões, o que dá uma diferença de 6 milhões de votos a favor de Lula. A soma dos votos de Bolsonaro e Lula foi de 107 milhões, que se supõe que não vão mudar no segundo turno. A disputa entre ambos se dará nesses 18 milhões da diferença dos votos válidos e os dados a cada um (125 – 107).

Lula, com 57 milhões de votos, precisa de mais seis milhões, para chegar aos 63 milhões, enquanto Bolsonaro, com 51 milhões, precisa de 12 milhões. 

Um engenheiro amigo me fez esse cálculo. A situação é bem mais confortável para Lula, mas, nesse país do imponderável, tudo é possível.


Redistribuição de votos

Simone Tebet, do MDB, fez 4,16%, ou 4,9 milhões, e Ciro Gomes, do PDT, 3,05% ou 3,9 milhões. Fica evidente que poderiam ter decidido a eleição para Lula no primeiro turno. Para onde irão esses votos? 

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Tebet evidenciou nos debates que quer o fim do Bolsonaro, ao enfrentá-lo com galhardia. Sua família é proprietária de uma rede de motéis, ou seja, não integra o agronegócio. O fato é que quem votou nela não queria Lula nem Bolsonaro. A incógnita é se prevalece o anti-lulismo ou anti-bolsonarismo. 

Ciro Gomes perdeu as estribeiras, dividiu a própria família e condenou o PDT ao ostracismo. O partido está dividido e quem era pró-Lula já votou no primeiro turno.

Com o Congresso mais reacionário e de extrema-direita de nossa história, para governo do PT dar certo, terá que concentrar todos os esforços na comunicação

Instituto Lula
Lula terá que manter as massas mobilizadas e, mais que isso, saber comunicar-se com o povo




Disputa nos Estados

15 governadores foram eleitos no primeiro turno, 12 foram reeleitos e 12 terão segundo turno. A direita elegeu nove governadores em primeiro turno (AC, DF, GO, MG, MT, PR, RJ, RO, TO), disputou dois no segundo, e fez maioria no Congresso. 

O PT elegeu três, em CE, PI, e RN e disputa do segundo turno em SP, com o Republicanos, em SC com o PL, na BA com o União Brasil. Por partidos, no primeiro turno:

Partido Estado
PT CE, PI, RN
PP AC, RO
Solidariedade AP
MCB DF, PA
União GO, MT
PSB MA
Novo MG
PSD PR
PL RJ
Republicanos TO


Disputam o segundo turno em 12 estados. Os primeiros colocados têm mais chance.

MDB x União AL MDB
MDB x União AM União
PT x PSD SE PL
PT x União BA União
PP x Rep SC Rep
PT X Rep SP PT
PL x PSD ES PSB
MDB x PSDB MS MDB
PSB x PSDB PB PSB
Soli x PSDB PE Soli
PL x PSDB     RS PL
PL x União RO União


Congresso de mal a pior

No Senado, com 81 assentos, a direita deu de lavada, não só em número, mas na baixa qualidade dos eleitos. 

A esquerda conta com 11 assentos: PT conta com 9, Rede 1, PSB 1. 

A direita conta com 53: Podemos 6, Republicanos 3, PP 7, União 12, PL 13, PTB 2, PSD 10. 

Vão atuar como fiel da balança 19 senadores: MDB com 10, PSDB 4, PDT 2, Cidadania 1, Pros 1, PSC 1.

No Congresso, pela esquerda, o PT conseguiu evoluir de uma bancada de 54 para 68 deputados. Com os votos dos demais da federação, PCdoB e PV, somam 80. A federação Psol-Rede elegeu mais 14. O que podemos chamar de esquerda tem 94 votos. Na melhor das hipóteses, mobilizando democratas dos demais partidos poderá obter 138 votos, contra o rolo compressor da direita de 293 votos. 

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Direita: PL bateu todos os recordes elegendo 99 deputados, seguido do União 59, PP 47, Republicanos 41, PSD 42, Novo 3, PTB 1. Só aí já somaram 292. 

Vão atuar como fiéis da balança, MDB 42, PSDB/Cidadania, 18, PDT 17, Solidariedade, 4, Patriota 4, Pros 3, PSC 6, Avante 7, Podemos 12, que na melhor das hipóteses somam 113 votos. 

Alguns fatos relevantes no contexto da esquerda:

  • Guilherme Boulos, coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, do Psol, teve mais de um milhão de votos para a Câmara Federal por São Paulo;

  • Luiza Erundina, do Psol, bateu recorde se reelegendo pela sétima vez deputada federal por São Paulo;

  • Erika Hilton, vereadora do Psol em São Paulo, é a primeira negra, mulher trans a ser eleita deputada federal;

  • Célia Xakriabá foi a primeira indígena eleita em Minas Gerais para a Câmara Federal pelo Psol;

  • Sonia Guajajara, indígena também do Psol, foi eleita federal por São Paulo;

  • Fernanda Melchonna, também do Psol, reeleita federal pelo Rio Grande do Sul;

  • Robeyonce, advogada travesti e negra, foi deputada federal do Psol por Pernambuco;

  • Camila Valadão, Pretas no Poder, do Psol, foi a mais votada na história do Espírito Santo;

  • Sílvia Waiãpi, indígena eleita deputada federal pelo PL do Amapá;

  • Carol Dartora, do PT, é a primeira negra eleita deputada federal na história do Paraná;

  • Fátima Bezerra, do PT, foi reeleita no 1º turno governadora do Rio Grande do Norte;

  • Benedita Silva, mulher negra do PT foi reeleita no Rio de Janeiro;

  • Camila Jara, do coletivo Elas Podem, do PT, foi eleita federal no Mato Grosso do Sul;

  • Juliana Cardoso, mulher indígena do PT de São Paulo, será deputada federal;

  • Paulo Guedes, indígena do PT de Minas Gerais, deputado federal;

  • Gleisi Hoffmann, presidente do PT, foi reeleita federal pelo Paraná.


Atores de um circo de horrores

Repórter político toda a vida, desde 1957, pensava não pudesse haver na história um Congresso Nacional de tão baixo nível, como o desta atual legislatura.

Pois esse nosso povo conseguiu eleger neste 2 de outubro algo pior. Teremos uma maioria de direita que já tínhamos, reforçada por um bando de desqualificados. Cito alguns:

  • General Braga Neto, ex ministro da Defesa, disputa como vice de Bolsonaro na chapa do PL;

  • General Eduardo Pazuello, ministro da Saúde que cometeu crimes apurados pela CPI da Covid, foi eleito deputado federal pelo PL do Rio de Janeiro; 

  • General Hamilton Mourão, era vice-presidente e presidia o Conselho da Amazônia, conivente com os incêndios e a ocupação ilegal de terras na Amazônia, eleito senador pelo PL do Rio Grande do Sul. Venceu Olívio Dutra, do PT; 

  • Coronel (astronauta) Marcos Pontes, ex-ministro da Ciência e Tecnologia, atuou contra a ciência e não deu recursos para as universidades e institutos de pesquisa, eleito senador por São Paulo. Derrotou Marcio França, apoiado por Lula e que foi governador de São Paulo;

  • Tereza Cristina, apelidada Miss Veneno, ex-ministra da Agricultura, fez nada para produzir alimentos, acabou com os organismos reguladores, foi eleita senadora pelo PP de Mato Grosso;

  • Pastora Damares Alves, ex-ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, acabou com a Justiça de Transição, entregou a Comissão de Anistia aos militares, foi eleita senadora pelo Republicano em Brasília;

  • Ricardo Salles, ex ministro do Meio Ambiente, aquele do “deixa passar a boiada” e do contrabando de madeira cortada ilegal, foi eleito pelo PL de São Paulo;

  • Mário Frias, ex ministro da Cultura, que acabou com toda e qualquer política pública de cultura, foi eleito deputado federal por São Paulo pelo PL;

  • Osmar Terra, ex-ministro da Cidadania, foi eleito deputado federal por Minas Gerais pelo MDB;

  • Rogério Marinho, ex-ministro do Desenvolvimento Regional, do PL, foi eleito senador pelo Rio Grande do Norte;

  • Marcelo Álvaro Antônio, ex-ministro do Turismo, foi reeleito deputado federal por Minas Gerias pelo PL;

  • Empresário Jorge Serf Jr, ex-secretário da Pesca, eleito senador por Santa Catarina;

  • Sérgio Moro, o juiz que fez a Operação Lava Jato em conluio com os Estados Unidos, traidor da pátria, ex-ministro da Justiça e Segurança, foi eleito senador pelo União Brasil, do Paraná;

  • Deltan Dallagnol, procurador que junto com Moro fez a operação mandada pelos Estados Unidos, traidor da pátria, foi eleito deputado federal pelo Podemos, também do Paraná, e foi o mais votado;

  • Onyx Lorenzoni, ex chefe da Casa Civil e do Trabalho, vai disputar o segundo turno pelo PL do Rio Grande do Sul contra o governador Eduardo Leite, do PSDB;

  • Capitão Tarcísio de Freitas, ex-ministro da Infraestrutura, disputando segundo turno para o governo de São Paulo, contra Fernando Haddad do PT.


Compra de votos descarada

Tá desempregado, ganhando pouco? Tem vaga para ser cabo eleitoral por até 80 mil reais. Isso sim é que é festança com o dinheiro público. Política virou negócio pros ricos ganharem mais dinheiro, ficarem mais ricos. 

Damares Alves, já gastou 535,5 mil, dinheiro público, dinheiro seu, meu, contratando gente para ser cabo eleitoral ganhando mil reais por dia. 

Se isso não é compra de voto, abuso do poder econômico, o que é? Os jornais publicam como se fosse a coisa mais normal do mundo, e nada acontece. Esses dados foram retirados do Estado de SP de 22/09/22.

Segundo a reportagem, o valor para pagamento de cabos eleitorais varia de 600 a 1.500 reais.

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Em Alagoas, Alfredo Gaspar, candidato do União Brasil, contratou empresa por 280 mil para fazer mobilização de rua. O que é isso? Arregimentar gente para divulgar o candidato e nele votar. Outros estão mais de 10 milhões contratando empresas para contratar os cabos eleitorais.

Claudio Castro, que se reelegeu governador do Rio de Janeiro, recebeu 12,5 milhões do Fundo Eleitoral, usou 5,7 para uma empresa contratar 36 mil cabos eleitorais, ganhando 114 por dia.

O falso padre Kelson, candidato do PTB à Presidência, recebeu R$ 1,5 milhão para tumultuar o debate realizado pela Rede Globo no dia 30 agredindo Lula. Foi um verdadeiro circo de horror. Quebrou todas as regras, mas assim mesmo a Globo o manteve.

É assim que funciona. Eu queria saber como um cara como o capitão do exército, Tarcísio, foi um ministro medíocre de um governo assassino, candidato a governador de São Paulo aparece cotado nas pesquisas. Tá explicado.


Outra eleição

Dizem que o segundo turno é outra eleição, uma nova eleição. Uma meia verdade. O cenário é o mesmo, o eleitor é o mesmo, a ignorância e alienação são as mesmas. Começa nova temporada do circo de horrores que nos brindaram.

Em nenhum momento os candidatos abordaram o caráter militar do governo, o que favoreceu enormemente o situacionismo. 

Atuação completamente ilegal dos militares que não tem que se meter em eleição. Antes eles tomavam conta dos postos de votação, levavam as urnas nos rincões mais remotos. É realmente insano a insistência em tutelar a nação. 

O desvio de função se dá também no número elevado de militares candidatos aos diferentes cargos eletivos. Segundo a Agência Pública, 1.520 candidatos se declararam militares no registro. Quantos mais sem declarar?

Se depreende que democracia com medo é falácia e que a mídia foi das principais transmissoras do medo. Outra manobra que ficou clara nesta eleição é o uso do blefe e da bazófia para manter a narrativa e a pauta nos meios de comunicação.

Esse panorama mostra uma governabilidade bastante difícil para Lula, caso vença no segundo turno. Para compensar o desequilíbrio, terá que manter as massas mobilizadas e, mais que isso, saber comunicar-se com o povo. Para dar certo tem que concentrar todos os esforços na comunicação.

Paulo Cannabrava Filho, jornalista latino-americano e editor da Revista Diálogos do Sul.


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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.
Paulo Cannabrava Filho Iniciou a carreira como repórter no jornal O Tempo, em 1957. Quatro anos depois, integrou a primeira equipe de correspondentes da Agência Prensa Latina. Hoje dirige a revista eletrônica Diálogos do Sul, inspirada no projeto Cadernos do Terceiro Mundo.

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