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Foto: Daniel Noboa / X

Equador: políticas de Noboa na segurança pública agudizam “modelo” de Lasso e Moreno

Além de colocar militares nas ruas e assinar tratados com os EUA, mandatário abriu caminho para discurso mais radical contra indígenas e correísmo
Orlando Pérez
La Jornada
Quito

Tradução:

Beatriz Cannabrava

Se há algo que explica a vitória eleitoral de Daniel Noboa em outubro de 2023, foi o seu discurso conciliador e de baixar as tensões no Equador. No ato de posse, em 23 de novembro passado, ele também disse que não era contra tudo. Ofereceu-se para trabalhar para todos e com todos, sem ódios, sem revanchismos, sem vinganças.

Seu discurso foi tão bem recebido que ele conseguiu um acordo legislativo e contou com maioria na Assembleia Nacional para cinco leis – em menos de três meses – que foram aprovadas por votação favorável. Embora duas delas, relacionadas a questões tributárias, tenham causado polêmica e aberto algumas brechas com o Movimento Revolução Cidadã, liderado por Rafael Correa.

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Até que a crise de segurança foi reativada, a partir de vários incidentes violentos provocados por grupos criminosos, levando Noboa a emitir, em 9 de janeiro último, algo que nunca havia acontecido antes neste país andino: conflito armado não internacional. Uma figura constitucional que é acionada quando ocorrem eventos extraordinários que exigem a participação direta das forças armadas e a declaração do estado de exceção.

Militares nas ruas

Com os militares nas ruas e a assinatura de dois tratados de segurança com os Estados Unidos, sua popularidade cresceu (chegando a 80% de aprovação), ao mesmo tempo em que seu tom autoritário lembrou o país dos atos impopulares e grotescos de Lenín Moreno e Guillermo Lasso, que se apoiaram na embaixada dos Estados Unidos e nos grupos mais conservadores da polícia e do exército.

A população aplaudia os controles e operações, mas também ressentia-se com os anúncios de medidas econômicas ordenadas pelo Fundo Monetário Internacional, com o objetivo de receber novos créditos: aumento de impostos, redução de funcionários públicos e uma medida que entrou em vigor em 1º de abril: o IVA passou de 12 para 15%, o que encareceu o consumo dos setores populares.

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Apoiado por Washington, com um embaixador americano que fala sobre política interna em qualquer fórum, sem que isso seja considerado intromissão nos assuntos internos, mas também com uma parte da imprensa pedindo mão dura e até mesmo que ele entre na embaixada para expulsar Jorge Glas, seus ministros e seus porta-vozes oficiais, ele abriu caminho para um discurso mais radical contra o movimento indígena e o chamado correísmo.

Promessas eleitorais

A maioria de suas promessas eleitorais ficaram para trás. Ele não aumentou o emprego, pelo contrário: mais de 80 mil pessoas saíram do setor formal. A emigração se aprofundou e mais de 30 mil equatorianos, nos dois primeiros meses deste ano, foram para os Estados Unidos. Em 2023, saíram 82 mil cidadãos no total. E em março, os sequestros, extorsões e assassinatos em massa por meio do sicariato duplicaram em relação a dezembro de 2023.

E Noboa, como Moreno e Lasso, não estava cumprindo suas promessas eleitorais e culpava os governos anteriores. Aos poucos, seu discurso tornou-se mais agressivo, desdenhoso com seus críticos e começou a usar trajes militares em suas aparições, acompanhado pelos altos comandos da polícia e do exército. Alguns analistas já advertiam nesses símbolos e discursos um estilo autoritário que culminaria no que aconteceu na embaixada mexicana em 5 de abril passado.

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De fato, o sequestro do ex-vice-presidente Jorge Glas e agora o anúncio nas redes sociais, posteriormente oficialmente desmentido, da proibição de voos de origem mexicana no espaço aéreo equatoriano, são vistos como ações beligerantes, pouco reflexivas e de uma profunda repercussão internacional, que aparentemente não o preocupam.

O que o Equador perde imediatamente com o México?

A invasão à embaixada mexicana e a consequente ruptura das relações diplomáticas comprometem muitos setores econômicos do Equador, pois as exportações para o México em 2023 foram de 204 milhões de dólares, representando 1% de todas as exportações, quase o mesmo que é exportado para a Argentina e Bélgica. Além disso, é o segundo destino de artesanato diverso (20%), quarto em maquinaria industrial (11%) e quarto em chapéus de palha toquilla (10%).

Por outro lado, as importações do México totalizaram 704 milhões de dólares em 2023, o que representa 2% de todas as importações. E o saldo comercial não petrolífero com o México em 2023 foi negativo em 458 milhões.

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Há um elemento que pode afetar agora as famílias mais pobres ou de classe média baixa: as remessas. Do Equador para o México, foram enviados 131,3 milhões de dólares em remessas em 2023. Do México, em 2023, foram enviados para o Equador 95 milhões de dólares, sendo o quarto país que mais remessas envia para o país andino.

Mas também há acordos culturais (a subsede do Fundo de Cultura Econômica em Quito é um dos espaços mais ativos), científicos, acadêmicos e até militares. Tudo isso agora é visto como um obstáculo para aqueles no México que encontravam uma oportunidade para suas profissões ou aspirações universitárias e acadêmicas.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.
Orlando Pérez Correspondente do La Jornada em Quito.

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