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Foto: UTEP / Facebook

Gás de pimenta e bala de borracha no rosto: repressão sob Milei é inspirada em Israel

Na última quarta-feira (11), manifestantes contrários ao ataque de Milei à previdência sofreram repressão brutal: “nunca tinha visto algo assim”
Stella Calloni
La Jornada
Buenos Aires

Tradução:

Beatriz Cannabrava

“Aqui estou, passem sobre o meu corpo se quiserem agredir os idosos, não vou me mover”, gritou uma mulher deitada na rua em frente às motos policiais, durante uma repressão cada vez mais brutal de mais de duas horas que deixou pelo menos 20 feridos, incluindo idosos, três crianças, uma adolescente, bem como jornalistas e cinegrafistas, durante uma manifestação que na quarta-feira (11) tentou encorajar os deputados a rejeitarem o veto do presidente Javier Milei à lei de mobilidade previdenciária, recentemente aprovada pelo Congresso.

Desde a manhã daquele dia, chegaram três caminhões hidrantes, caminhões de bombeiros, caminhões de assalto das forças de infantaria da Polícia Federal, da Prefeitura, da Gendarmaria, da Segurança Aeroportuária e da motorizada da cidade de Buenos Aires. Foram instaladas barreiras muito mais altas do que as anteriores em frente ao Congresso e nas esquinas de todas as ruas que levam ao recinto.

Leia também | Equipe de Milei lapida projeto de lei para libertar genocidas da ditadura argentina

A maioria concordava que “nunca tinha visto algo assim”, embora tenha havido repressões durante o governo do ex-presidente Mauricio Macri (2015-2019), atualmente associado ao ultradireitista governante La Libertad Avanza, e a então ministra da Segurança, Patricia Bullrich, que ocupa novamente o cargo.

O Projeto Antipiquetes, ilegalmente aplicado por Bullrich, é na realidade um design israelense, que inclui disparos de gás de pimenta e balas de borracha disparados no rosto e na cabeça.

O gás, com uma nova composição química que pode causar queimaduras graves, custa 220 mil pesos argentinos, e as aposentadorias mínimas variam entre 234 e 295 mil. O Centro de Estudos Legais e Sociais advertiu que se fala de armas não letais, mas o que determina se são ou não letais é a forma “como são utilizadas”.

Também foram utilizados cassetetes e escudos para empurrar os manifestantes pacíficos, mas as três fileiras de fardados, armados como se fosse para um combate, impediram o avanço de sindicatos, como o dos caminhoneiros.

Estiveram presentes na marcha o governador da província de Buenos Aires, Axel Kicillof, e altos funcionários daquela administração, bem como prefeitos, movimentos sociais e políticos, que também sofreram os efeitos do gás e alguns até agressões. “Não é uma questão de se há ou não dinheiro, mas de para que ele é usado e quem é beneficiado”, afirmou Kicillof.

O que aconteceu nesta quarta-feira, com quatro ondas de repressão e que está violentando todos os setores, é apenas por se recusar a aumentar as aposentadorias em 10 mil pesos, mas também impedir a mobilidade, ou seja, ajustar com relação aos salários dos trabalhadores sindicalizados.

Escândalo na Casa Rosada

Milei conseguiu “convencer” sete deputados da União Cívica Radical (URC) divulgando uma foto escandalosa do encontro deles com o mandatário na Casa Rosada. O mesmo aconteceu com outros blocos, que antes votaram contra e agora, abertamente “comprados”, seja com cargos especiais ou dinheiro. O resultado foi 153 a favor, 87 contra e oito abstenções.

Graças aos meios de comunicação, foi possível acompanhar parte por parte a repressão e suas consequências, como ver uma mulher sendo socorrida pelos próprios manifestantes depois de ter caído no chão, com um tiro de bala de borracha no pescoço.

Socorristas de uma organização civil, que já haviam ajudado em manifestações anteriores, atuaram novamente e foi necessário levar vários manifestantes de ambulância para os hospitais mais próximos.

Outra mulher que ficou diante das motos foi atropelada, o que fez com que dois policiais caíssem, sem nenhuma consequência para eles, mas sim para a mulher, que ficou ferida. Os fardados tentaram encobrir esses fatos, mas a verdade foi exposta pela coragem dos jornalistas, fotógrafos e cinegrafistas, que também foram lesionados.

Juan Marino, deputado da União pela Pátria pela província de Buenos Aires, pediu a rejeição do veto de Milei e afirmou que “organizações de aposentados e aposentadas vêm se manifestando há meses em frente a este Congresso denunciando o governo, que está lhes impondo um genocídio silencioso, e os traidores que viram as costas para todos eles por cargos, promessas de fundos para suas províncias ou simplesmente por afinidade política e ideológica com o governo nacional”.

Bullrich, carrasca da repressão de Milei

Também repudiou a repressão de Bullrich, que “pensa que reprimir é um ato que lhe beneficia eleitoralmente, e por isso, cada vez que tem oportunidade o faz”.

Dialogando com uma rádio local, a aposentada docente Nora Biaggio, que representa o Plenário de Trabalhadores Aposentados afirmou que o protesto contra o veto de Javier Milei acontece “massivamente” em todo o país. 

“Isto é uma reclamação popular indubitável que ganhou o conjunto da população”, destacando que não há nenhum tipo de direitos e garantias neste país. “Quando perseguem os restaurantes populares, os companheiros e companheiras que cozinham, o movimento das pessoas sem ocupação, quando a comida não chega aos refeitórios e quando querem tirar de nós aposentados o acesso a um pequeno aumento, põem um aparato repressivo brutal para que calemos a boca”. E acrescentou: “Aqui há formas de impor um ajuste sem repressão”; 

A imagem de idosos e crianças agredidos e machucados não sairá facilmente da mente de uma população que tem outro desafio: a lei de financiamento educacional que Milei quer impedir. Já há marchas de universitários, professores e sindicalistas.

A tensão que aumenta a cada dia, a incerteza e a impossibilidade de milhões de argentinos de comprar medicamentos, alimentos e pagar as altas tarifas, indica “que estamos caminhando sobre um fio, que já não pode nos sustentar”, como disse Esteban, um aposentado de 80 anos lesionado seriamente, mas que reafirma a vontade de lutar pelos direitos essenciais. A palavra ditadura, em referência ao governo de Milei, se impõe em todas as vozes nesse dia difícil de esquecer.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Stella Calloni Atuou como correspondente de guerra em países da América Central e África do Norte. Já entrevistou diferentes chefes de Estado, como Fidel Castro, Hugo Chávez, Evo Morales, Luiz Inácio Lula da Silva, Rafael Correa, Daniel Ortega, Salvador Allende, etc.

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