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Salas trancadas e simulações de emergência: o preparo contra tiroteios nas escolas dos EUA

Tornou-se comum, quase normal, que todos os dias se reporte um tiroteio massivo ou uma ameaça pública com armas de fogo no país
David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

Os principais fabricantes de armas de fogo lucraram com a venda de rifles semiautomáticos tipo AR-15 – entre os favoritos empregados em tiroteios massivos – ganhando mais de um bilhão de dólares durante a última década, e recusam assumir responsabilidade pela comercialização e uso dos produtos letais, conclui uma investigação da câmara baixa do Congresso dos EUA difundida na última quarta-feira (3).

“A indústria de armas de fogo está obtendo lucros sobre o sangue de estadunidenses inocentes”, acusou a deputada democrata Carolyn Maloney, na apresentação do informe elaborado pelo Comitê de Supervisão e Reforma Governamental da câmara baixa que ela preside. Maloney acrescentou que as práticas de negócio dessa indústria são “preocupantes”, assinalando que ninguém monitora “a morte e a destruição causada por seus produtos”.

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A investigação foi enfocada em cinco das principais empresas de fabricação de armas de fogo, algumas das quais enfrentam uma demanda do governo do México ante um tribunal em Massachusetts em um caso que segue em curso.

As empresas recusam responsabilidade no uso de seus produtos e as cinco reconheceram aos investigadores do congresso que não têm nenhum tipo de processo interno para arrecadar informação com o uso de seus produtos. 

Nos EUA, total de armas de fogo ultrapassa população e causa recorde de mortes em 2020

Mas os custos para evitar as consequências da violência em um país com mais de 400 milhões de armas em mãos privadas são sentidos por todo o território nacional, e se tornaram parte da rotina de lugares públicos, como as escolas. 

“Em minha escola primária, dizemos às crianças que temos que nos preparar se acaso entre gente má que nos quer fazer dano e fechamos com chave a porta da classe, baixamos as persianas e pedimos que não façam um só ruído”, explica ao La Jornada uma professora do jardim da infância de uma escola pública no Brooklyn ao descrever os exercícios de rotina que são feitos nas escolas dos Estados Unidos para preparar-se em caso de entrada de uma pessoa armada.

“Há colegas que estão encarregados de buscar crianças nos banheiros para levá-los a um lugar mais seguro”, enquanto nas escolas secundárias e preparatórias, todo estudante e professor está obrigado a praticar o que fazer e como fugir de uma pessoa armada em seus locais. 

Tornou-se comum, quase normal, que todos os dias se reporte um tiroteio massivo ou uma ameaça pública com armas de fogo no país

U.S. Government – Rawpixel
Segundo dados oficiais, as armas de fogo se tornaram a principal causa de morte de crianças e adolescentes




Comum, “quase normal”

Tornou-se comum, quase normal, que todos os dias se reporte um tiroteio massivo ou uma ameaça pública com armas de fogo nos Estados Unidos: na segunda-feira (1), uma mulher tirou uma pistola e disparou ao teto no aeroporto Love Field de Dallas. No dia anterior, morreram dois e cinco foram feridos em San Pedro, Califórnia; há dois dias, dois morreram e outros dois ficaram feridos em Rockford, Illinois – a lista aumenta de maneira incessante. 

Nesta mesma quarta-feira, enquanto se realizava a audiência em Washington, o homem acusado de um tiroteio contra espectadores de um desfile do Dia da Independência em Illinois, no dia 4 de julho passado, matando sete pessoas e ferindo mais de 35, foi formalmente acusado por 117 delitos, incluindo homicídio. 

Esse tiroteio foi antecedido em maio por outro em uma escola primária em Uvalde, Texas, onde foram assassinadas 19 crianças e dois professores. Pouco antes disso, outro massacre em um supermercado em Buffalo, Nova York, deixou 10 pessoas mortas.  

Nestes três incidentes, os assassinos empregaram rifles semiautomáticos estilo AR-15, todos adquiridos legalmente.

Estes episódios foram notícia nacional, mas não os únicos em 2022. Nesse ano, foram registrados 372 tiroteios qualificados como “massivos”, nos quais há pelo menos quatro vítimas (mortos ou feridos). Para ver cada incidente de 2022, clique aqui.

Brasil foi terceiro país que mais exportou armas de fogo aos EUA em 2020, aponta estudo

Ao mesmo tempo, hoje continuou o processo judicial para determinar a condenação – entre prisão perpétua ou execução – do acusado que se proclamou culpado de matar com um rifle semiautomático 17 pessoas e ferir mais 17 numa escola preparatória em Parkland, Florida, em fevereiro de 2018.  

O pai de uma das jovens assassinadas nesse tiroteio, Fred Guttenberg, falou sobre a audiência em Washington, enquanto observa o julgamento na Flórida. Foi apresenta evidência sobre os danos que a bala de um rifle do tipo AR-15 causa em uma vítima como sua filha. “Posto de maneira simples, minha filha Jaime e todas as vítimas de violência de armas de fogo são só um custo dos negócios das empresas de armas”, disse Guttenberg.

Embora se tenha tornado notícia cotidiana e aparentemente inevitável, não há nada que sacuda mais que incidentes de armas de fogo em uma escola. 

Registraram-se pelo menos 95 incidentes a bala em escolas, resultando em 40 mortes e 76 feridos, desde o início de 2022, reporta o Everytown for Gun Safety.

Cannabrava: Aumento da miséria e do número de armas de fogo faz explodir violência

No ano escolar 2020-2021, se registraram pelo menos 93 incidentes de uso de armas nos quais houve mortes nas escolas – o número mais alto desde que se iniciou a contagem desse fenômeno há duas décadas.

A Eleven Films apresentou um breve vídeo, Awaken Dawn, transmitido por MSNBC com a introdução: “isto não é um filme, isto é os Estados Unidos”, onde captura de maneira devastadora algumas dimensões dos tiroteios massivos em escolas durante os últimos anos.

Segundo dados oficiais, as armas de fogo se tornaram a principal causa de morte de crianças e adolescentes – a cada ano, mais de 3.500 menores de idade morrem baleados e outros 15 mil são feridos. 

March for our Lives, o movimento nacional encabeçado pelos estudantes sobreviventes do massacre na escola preparatória de Parkland, emitiram uma mensagem nesta semana declarando: “estamos vivendo em um tempo de violência de armas que rompeu recordes em nosso país… Esta é uma emergência nacional para todos, em todas as partes”.

Acesse o resumo do informe do Congresso aqui.

David Brooks, correspondente do La Jornada em Nova York.
Tradução: Beatriz Cannabrava.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.
David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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