Conteúdo da página
ToggleUma mulher é abordada na rua. Arrancada de seu meio de transporte, é arrastada por um bando de homens para dentro de uma Igreja. Lá ela é despida, torturada e apedrejada até morrer. Seu cadáver, é então, trazido para a praça e lá, esquartejado. Fogueiras montadas às pressas, incineram aqueles restos mortais. A ralé entusiasmada comemora e durante toda a noite reza e agradece a Deus.
Essa é uma das milhares de histórias ocorridas durante séculos de intolerância religiosa. Principalmente, desde quando o Império romano decadente se uniu à igreja Católica!
Leia também | Organizações do Brasil e do mundo se unem em apoio às mulheres palestinas
O caso que hoje vamos tratar passou-se no século V depois de Cristo.
A rua é da cidade de Alexandria, no Egito, que nos tempos anteriores ao domínio da Igreja associado ao Estado, fora um dos mais importantes centros culturais do mundo, possuidora da maior Biblioteca e do primeiro Museu da antiguidade, local onde também funcionava uma Universidade!
Quando Teófilo, o arcebispo católico, que comandou a última destruição da grande Biblioteca de Alexandria, faleceu em 412, foi sucedido por seu sobrinho, Cirilo, que deu continuidade à política de intolerância e hostilidade para com outras religiões, até então levada a cabo por seu tio.
A vítima: Hipátia de Alexandria.
No comando de seu assassinato, um assecla do arcebispo Cirilo, Pedro, conhecido como “O Leitor da Bíblia”.
O sábio Teon, pai de Hipátia
O último membro conhecido do Museu é o matemático e astrônomo Téon. Alguns dos escritos de Téon ainda existem, como comentários de geometria à obra de Euclides, “Os Elementos”. Entretanto, pouco se sabe a respeito de sua família. É possível que Hipátia não fosse sua filha única; Epifânio, um de seus discípulos favoritos, era irmão de Hipátia.
Leia também | Mulher economista: confira mais 7 grandes momentos de Dilma Rousseff em 2023
Segundo se acredita, Teón teria ensinado matemática e astronomia para Hipátia, que mais tarde viria a contribuir em alguns de seus trabalhos. Acredita-se que o “Livro III da versão de Téon para Almagesto”, um tratado que estabeleceu um modelo geocêntrico para o sistema solar, derrubado apenas no tempo de Copérnico e Galileu, foi, na verdade, trabalho de sua filha.
Hipátia de Alexandria
Hipátia era uma mulher extraordinária! Trilhou, corajosamente um caminho costumeiramente feito por homens, como seu pai. Na matemática, escreveu e ensinou sobre astronomia (incluindo seus aspectos observacionais, como o astrolábio), geometria (modo avançado) e, na álgebra fez um avanço na técnica computacional!
Além disso tudo, se envolveu-se com filosofia e religiosidade. Na verdade, Hipátia foi continuadora de um programa iniciado por seu pai: um esforço consciente para preservar e elucidar as grandes obras matemáticas da herança alexandrina. Mas Hipátia realizou também seus próprios comentários a obras de importantes pensadores, assim como teve muitos alunos. De acordo com uma carta escrita por um deles sobre essas aulas, os ensinamentos da filósofa incluíam como projetar corretamente um astrolábio, uma espécie de calculadora portátil, utilizada até o século XIX.
Leia também | Tríade heroína: as mulheres combatentes que dão face à luta baiana por Independência
Hipátia também se tornou famosa como pensadora da Escola Neoplatônica de Alexandria. As palestras públicas de Hipátia logo começaram a atrair a atenção popular. Vestida em sua túnica, ela fazia “aparições em torno do centro da cidade, expondo-se em público para aqueles que queriam ouvir sobre Platão e Aristóteles”, conforme escreveu o filósofo Damáscio após seu cruel assassinato.
“Quase sozinha, virtualmente a última acadêmica, ela defendia os valores intelectuais, a matemática rigorosa, o neoplatonismo ascético, o papel crucial da mente e a voz da temperança e da moderação na vida cívica”, escreveu Deakin. De acordo com o “Suda”, uma enciclopédia do século X sobre o mundo mediterrâneo, Hipátia era “extremamente bela e formosa… seu discurso lógico e articulado, suas ações prudentes e comunitárias, o que lhe garantiu as boas-vindas da cidade e seu especial respeito”.
Entre seus admiradores se encontrava o governante de Alexandria, Orestes, que também acabou sendo assassinado a mando da Igreja, graças a sua associação à filósofa.
O assassinato da mulher-filósofa
Sua morte está inserida num ponto de cisão na História: a passagem da idade Clássica pagã para a idade Média cristã.
Ela é um símbolo feminista e mártir!
Voltaire, um dos mestres do Iluminismo, inclusive utilizaria sua morte brutal para condenar a intolerância religiosa e os abusos da Igreja no século XVIII.
Referências:
Mark, Joshua J. “Hypatia of Alexandria”.
Zielisinski, Sarah. “Hypatia, anient Alexandria’s great female scholar”.