Com transmissão ao vivo em várias estações de rádio, 12 policiais enfrentaram durante toda a manhã da última segunda-feira (20) um ataque massivo de pelo menos 120 guerrilheiros que usaram armas de alto calibre e explosivos artesanais no departamento do Cauca, no sudoeste da Colômbia.
Os sons das metralhadoras serviram como trilha sonora para a transmissão feita por jornalistas locais da pequena cidade montanhosa de Morales, evocando inevitavelmente a antiga cena de tomadas de municípios por forças irregulares. De acordo com números do Centro Nacional de Memória Histórica (CNMH), desde o início do conflito interno colombiano, na década de 1960, houve 1900 incursões de grupos armados à margem da lei nas sedes municipais. No entanto, essa prática havia diminuído substancialmente após a assinatura dos acordos de paz de 2016 entre o governo do presidente Juan Manuel Santos e as hoje extintas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC).
Leia também | Violação dos acordos de paz: entenda por que Petro vai denunciar a própria Colômbia na ONU
Por volta do meio-dia, após o início do assalto, o governador do Cauca, Jorge Octavio Guzmán, confirmou que dois policiais morreram e três ficaram gravemente feridos, enquanto importantes danos foram registrados na infraestrutura de Morales. Uma hora antes desse ataque, unidades guerrilheiras das frentes Jaime Martínez e Dagoberto Ramos, pertencentes a dissidências das FARC que não aderiram aos acordos de 2016, detonaram um carro-bomba em frente a um hotel na cidade de Jamundí, deixando dois policiais e nove civis feridos, incluindo três menores de idade. Fontes militares reportaram escaramuças nas cidades de Suárez e Dagua, também no departamento do Cauca.
As estruturas armadas que atacaram fazem parte do chamado Bloco Ocidental das dissidências, que até apenas três meses atrás mantinham um cessar-fogo com o Exército Nacional, no contexto de negociações de paz iniciadas pelo presidente Petro em meados de 2023.
Dissidências das dissidências
Com cerca de 2.800 homens armados, o Bloco Ocidental se desligou do restante da organização, acusando seus líderes de traidores e de provocar uma divisão interna. Segundo fontes militares, pelo menos 15 frentes das dissidências operam nos departamentos de Cauca, Putumayo e Nariño, especialmente em áreas dedicadas a economias ilegais como extração de ouro e cultivo de coca e maconha. Nariño é considerado um dos maiores produtores de coca do país e um porto de exportação de cocaína através do Oceano Pacífico.
Sob o comando de um enigmático comandante chamado Iván Mordisco, essas estruturas abandonaram a mesa de negociações com o governo, que atualmente mantém conversações apenas com os blocos Oriental e do Magdalena Médio, que somam cerca de 1500 combatentes. Analistas militares opinaram que os ataques simultâneos desta segunda foram uma resposta das dissidências a uma ofensiva, com artilharia pesada, do exército na cidade de El Plateado no mês de abril, que deixou dezenas de guerrilheiros mortos.
Leia também | Descumprimento de acordos coloca em risco processo de paz na Colômbia
Em entrevista coletiva, o governador do Cauca cobrou que o Governo Nacional não aumentou o contingente militar em seu departamento, onde – segundo ele – atuam 11 grupos armados ilegais. O presidente Gustavo Petro ordenou ao ministro da Defesa Iván Velásquez que se deslocasse para Cauca com os altos comandos militares e escreveu em sua conta de X: “É inaceitável a situação no Cauca. Não toleraremos que a população continue sendo ameaçada por atentados terroristas.”
Por sua vez, a senadora de oposição Paloma Valencia acusou o governo de fomentar o atual escalonamento do confronto bélico: “o Presidente deve fazer presença no Cauca imediatamente e enfrentar as consequências de sua política de paz total que entregou o território caucano e permitiu que os ilegais aumentassem seus homens na guerra”.
La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.