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Política de Abinader contra refugiados do Haiti é contradição que ameaça economia dominicana

Abinader decidiu fechar a fronteira entre os dois países e fortalecer a presença militar, com uma queda no comércio bilateral considerado fundamental pelas partes
Mariela Pérez Valenzuela
Prensa Latina
Santo Domingo

Tradução:

Ana Cobisier

Luis Abinader, 56 anos, do Partido Revolucionário Moderno (PRM), procedente de uma endinheirada família de origem libanesa, é economista – com vários títulos obtidos nos Estados Unidos e experiência empresarial, inclusive nas firmas de sua família.

O tema econômico está chamado a ser fundamental na agenda do dignatário. Um informe do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), publicado em março passado, indicou que cerca de 1% das maiores fortunas locais controla cerca de 42% da riqueza total da nação.

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Em Quisqueya, nome indígena originário deste país que compartilha a ilha La Española com o Haiti, vivem 11 milhões de pessoas. A alta emigração demonstra que a situação econômica levou a outros países uma importante massa populacional.

Ainda que a República Dominicana tenha experimentado nos últimos anos um crescimento econômico importante, Abinader tentará, segundo expressou, pôr em marcha novos investimentos estrangeiros que gerem mais empregos, sem esquecer que fez da luta contra a corrupção uma de suas promessas quando assumiu, em 2020, sob os estragos da pandemia da Covid-19.

Dados oficiais

Dados oficiais indicam que em 2023 o turismo contribuiu com 10 bilhões de dólares para o Produto Interno Bruto (PIB) e as remessas enviadas do estrangeiro chegaram a quase 11 bilhões de dólares, 3,1% mais em comparação com o ano precedente, e o investimento estrangeiro direto teve um recorde de 4.300 milhões de moeda verde, destinada em especial à construção hoteleira.

No entanto, apesar destes altos índices, a geração de empregos nos últimos anos não cobre as expectativas e a taxa de desocupação ficou em 5,0% no último trimestre de 2023, enquanto a metade da população economicamente ativa se move na informalidade, em muitos casos em situações precárias.

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A pobreza afetou nos últimos quatro anos quase uma quarta parte da população, e a pobreza extrema, 3%. Informação fornecida pela administração de Abinader admite que a maioria dos núcleos de baixa renda reside em zonas urbanas, e 63% são chefiados por mulheres. Abinader está em dívida com a massa feminina local e terá que esforçar-se para alcançar uma paridade de gênero agora inexistente.

A posição de desvantagem da mulher dominicana teve sua expressão nas recentes eleições, nas quais, de nove candidatos a ocupar o Palácio Nacional só duas eram mulheres; uma situação parecida à das eleições municipais de fevereiro último, sobretudo em altos cargos.

Apenas paliativos

Na opinião de analistas, as políticas sociais implementadas no último quatriênio foram apenas um paliativo no cruento cenário social em que subsiste grande parte da população. Portanto, o presidente deveria solucionar problemas estruturais de uma economia de serviços. Para especialistas, as cadeias de valor globais atribuem à República Dominicana o papel de operar como uma maquiladora tecnológica potencializada pelas múltiplas zonas francas existentes, de caráter privado, estatais e mistas instaladas em seu território desde 1985.

Aliás, é preciso considerar que esta parte da ilha é um dos principais destinos turísticos da região, com mais de 10 milhões de visitantes em 2023; além de possuir uma bacia de minerais e uma pequena indústria manufatureira.

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Especial interesse mostrou a administração do PRM nas Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC), ferramentas e programas informáticos utilizados para criar novas formas a respeito em diferentes setores. No início do ano passado, a Oficina Nacional de Estatísticas registrou 2.187 empresas que operavam com TIC, e que, segundo esta fonte, empregam 33 mil pessoas, com uma relação de dois para um entre homens e mulheres.

Outro dado importante fornecido pelo governo é que os ingressos por exportações de produtos manufaturados chegaram em 2023 a pouco mais de 1.500 milhões de dólares no total. Desta cifra, a produção minerária sem agregação de valor na origem explica 50,18%, o setor industrial 48,04% e o resto, a produção agropecuária.

Migração e relação com o Haiti

Um dos temas recorrentes neste segundo mandato de Abinader será o da migração. Este sensível assunto se concentra, fundamentalmente, na controvertida relação histórica com seu vizinho Haiti. Em resposta à decisão dos agricultores haitianos de fomentar um canal de irrigação no rio Masacre (Dajabón, na República Dominicana), o governante decidiu fechar a fronteira comum e fortalecer a presença militar, com uma queda no comércio bilateral considerado fundamental pelas partes. Em recentes declarações, e ante a iminente chegada de uma força multinacional ao Haiti para tratar de neutralizar os grupos paramilitares, o presidente enfatizou que seu país não integrará nenhuma equipe estrangeira e só dará, se for necessário, ajuda humanitária.

Para analistas, sua postura frente à crise do vizinho Haiti, de defesa da soberania nacional, ao impulsionar a construção de uma vala fronteiriça, repudiar a chegada de refugiados e aumentar as deportações de haitianos e de cidadãos em situação irregular, é bem recebida. No último ano, cerca de 200 mil haitianos foram deportados deste país. No entanto, a posição oficial é que setores da economia dominicana, como a agricultura e a construção, dependem do Haiti, devido às relações comerciais bilaterais e à utilização de mão-de-obra migrante a custos muito baixos. Uma contradição latente e importante para a nova administração.

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Os observadores políticos consideram que os planos da Abinader até 2028 são variados e tendem, pelo menos nos seus discursos, a melhorar a qualidade de vida das pessoas empobrecidas, dando especial atenção à educação, saúde, habitação e outros ramos da superestrutura nacional.

Para o seu segundo mandato enfrenta desafios como a inflação e a insegurança dos cidadãos, uma das maiores preocupações dos dominicanos, e propõe reformar a Constituição para fortalecer instituições como o Ministério Público. Mas a prática é mais rica que a teoria. É preciso ver as condições internas e internacionais em que trabalhará esse empresário que entrou plenamente na política em 2012 e oito anos depois já usava a faixa presidencial.

Prensa Latina, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Mariela Pérez Valenzuela

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