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“Trem de Aragua”: debate sobre suposta facção gera crise entre Chile e Venezuela

Controvérsia começou quando, em 9 de abril, Caracas categorizou a existência do grupo como uma "ficção"; Santigado fala em "insulto"
Aldo Anfossi
La Jornada
Santiago del Chile

Tradução:

Beatriz Cannabrava

Os governos do Chile e da Venezuela tiveram um conflito diplomático em razão da existência ou não do “Trem de Aragua”, uma organização do crime organizado supostamente nascida na prisão de Tocorón, em Caracas, e da qual há centenas de membros presos nas prisões chilenas, segundo asseguram as autoridades locais.

A controvérsia se desatou quando, em 9 de abril, o chanceler venezuelano, Yvan Gil, disse que “o Trem de Aragua é uma ficção criada pelos meios internacionais para tratar de criar uma etiqueta inexistente, como fizeram, em seu momento, com o Cartel dos Soles (…) que se demonstrou que não existe, que jamais existiu”. A afirmação foi feita enquanto estava em Cúcuta, Colômbia – outro dos países que haveria sofrido a expansão regional dessa organização mafiosa – reunido com seu par, Luis Gilberto Murillo.

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Estas afirmações provocaram a reação da ministra do Interior chilena, Carolina Tohá, para quem são “um insulto, não ao governo do Chile, mas ao povo do Chile e aos povos da América Latina, inaceitável”. “Pessoas perderam seus familiares, perderam a tranquilidade de seus bairros, perderam seus negócios por isso”, acrescentou.

A oposição direitista ao presidente Gabriel Boric, que a fustiga todos os dias por temas migratórios, delinquência e segurança pública, começou imediatamente a capitalizar o ponto, dizendo que na noite de quarta-feira (10), em um bairro de Santiago, foi assassinado um tenente da polícia de carabineiros, Emanuel Sánchez Soto (27), quando como civil e acompanhado de sua família, repeliu um assalto. Quatro cidadãos venezuelanos, três dos quais residem no país ilegalmente, foram detidos, um dos quais tinha ordem de expulsão.

Acordo sobre imigrantes ilegais

Em meados de 2023, Chile e Venezuela acordaram normas para facilitar a expulsão e repatriação de imigrantes ilegais, um acordo que não foi oficializado por Caracas, dizem oficiais chilenos.

Boric reagiu na quinta-feira (11) anunciando o “chamado a consultas” do embaixador chileno em Caracas. “As recentes afirmações irresponsáveis do Chanceler da Venezuela, que desconhecem a existência do Trem de Aragua, um grupo criminoso conhecido por suas atividades ilícitas no Chile e em toda a região da América do Sul, são profundamente preocupantes e constituem um grave insulto para aqueles que foram vítimas desta organização e para suas famílias, e o tomamos como um insulto também aos Estados que foram vítimas do Trem de Aragua”, justificou.

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E acrescentou que “não só demonstra uma falta de compromisso com a cooperação internacional necessária em matéria de segurança, mas também demonstra uma negativa a acordar de maneira efetiva os problemas transnacionais do crime organizado. A negação não serve e não é tolerável”.

Em declarações feitas em 2023, o Promotor Regional de Tarapacá (no norte do país, fronteiriço com Peru e Bolívia), Raul Arancibia, o Ministério Público identificou pelo menos 350 membros do “Trem de Aragua” que operam no Chile, dos quais 123 estavam presos. Segundo o promotor, essa agrupação criminosa comete delitos como tráfico de migrantes, de drogas e de armas, além de sequestros, exploração sexual, extorsão e homicídio.

Além do diferendo diplomático, existem muitas publicações internacionais que avaliam a existência do “Trem de Aragua”. Em setembro de 2023, a agência de notícias AFP publicou que “o governo da Venezuela confirmou nesta sexta-feira (22) a fuga do máximo líder da organização criminosa Trem de Aragua, três dias depois que as autoridades tomaram uma pressão controlada por esse grupo que opera em vários países da América Latina”. “Recompensa. Se busca”, se lê em um cartaz divulgado nas redes sociais pelo Ministério de Interior e Justiça venezuelano, incluindo fotografia, nome e número de cédula de identidade de Héctor Guerrero, vulgo ‘El Niño’ Guerrero, que seria o máximo líder da organização, disse à AFP.

Assassinato de Ronald Ojeda foi crime político, afirma justiça do Chile

Um promotor chileno a cargo de investigar o sequestro e assassinato do ex-tenente venezuelano, Ronald Ojeda, cometido em Santiago em fevereiro, assegurou que se trata de um crime político que foi organizado e se solicitou o sequestro e posterior homicídio desde Venezuela, por encargo da máfia organizada conhecida como “Trem de Aragua”.

O promotor a cargo do caso, Héctor Barros, disse isso ao noticiário Chilevisión, agregando que não se trata de um delito vinculado ao crime organizado. “Nesse caso, nós descartamos todas as teses que tenham a ver com a participação dele em algo ilícito (como se especulou inicialmente), portanto, a única tese é a que o senhor indica (crime político)”, disse.

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“Há um grau de organização, de execução deste delito, que nós não temos visto. O Trem de Aragua nunca agiu como o fizeram neste caso, disfarçados de policiais; a dar-se o trabalho, além disso, de enterrá-lo a 1 metro e 40 e cimentar a zona”, afirmou.

Sentenciou que “nós sustentamos que isso se organizou, se solicitou o sequestro e posterior homicídio do senhor Ojeda desde a Venezuela; até o momento não tenho outro antecedente que nos demonstre ou nos indique para outro lado”.

“Refugiado político”

Ojeda, de 32 anos, um ex-militar opositor ao governo que tinha status de refugiado político no Chile, foi sequestrado de seu apartamento em Santiago na madrugada de quarta-feira, 21 de fevereiro, por quatro sujeitos que fingiram ser da Polícia de Investigações (PDI) do Chile, sacaram Ojeda à força de seu apartamento em Santiago. Câmaras de segurança registaram o momento, tanto no interior do edifício como na saída, onde se pode ver o sequestrado em roupa íntima, amarrado e levado à força por homens armados. Seu cadáver, esquartejado, dentro de uma maleta e sob um bloco de cimento a 1,4 metros de profundidade, foi recuperado em 1º de março em local precário ao poente de Santiago, onde habitam cerca de 600 famílias, principalmente haitianas e venezuelanas.

“Cheguei à conclusão de que a pessoa que traslada a vítima efetivamente é uma pessoa que tem preparo e que tem uma condição distinta aos demais partícipes”, disse o promotor.

Naa Venezuela, se informou que o promotor-geral da República, Tarek Willian Saab, em sua conta na rede social X, informou que na passada quinta-feira (10) recebeu via correio eletrônico “uma solicitação de cooperação interinstitucional feita pela Promotoria-Geral do Chile”, solicitando dados pessoais e antecedentes penais de 5 pessoas presumivelmente vinculadas ao homicídio de Ronald Ojeda.

O chanceler venezuelano acrescentou que com base na solicitação recebida está “providenciando a localização dos sujeitos assinalados como presumidos envolvidos em dito crime, para sua imediata detenção no caso de os mesmos se encontrarem em nosso território, conforme nossas obrigações nacionais e internacionais”.

O chanceler venezuelano, Yvan Gil, anunciou na tarde de sexta-feira (12) “a colaboração absoluta” de seu país para prender os presumidos sequestradores e homicidas de Ojeda, e que tinham fugido à Venezuela, identificando-os como Walter del Jesús Rodríguez e Maickel Villegas Rodríguez, os quais escaparam do Chile por passagens não habilitadas depois de cometer o crime.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Aldo Anfossi

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