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Entenda o que está por trás do assassinato de cientistas islâmicos executados por Israel

Antes do assassinato e martírio do Dr. Fakhrizadeh, o premiê de Israel, Benjamin Netanyahu, disse em conferência, em Tel Aviv: “Lembrem-se deste nome”
Bruno Beaklini
Diálogos do Sul Global
São Paulo (SP)

Tradução:

Mohsen Fakhrizadeh era o principal cientista nuclear iraniano, ao menos sob o conhecimento das agências de segurança e inteligência dos países imperialistas ocidentais, e foi martirizado em 27 de novembro de 2020. Até o momento de conclusão deste artigo, nenhum Estado assumiu a autoria do atentado e, caso o fizesse, seria o reconhecimento de um crime internacional, uma autêntica declaração de guerra ao Irã e seus aliados no Grande Oriente Médio.

“Coincidentemente”, o presidente não reeleito dos EUA, o republicano Donald Trump, anunciou alguma escala de agressões contra Teerã, ainda no final de seu mandato. Não bastasse a 5ª Frota estacionada no Bahrain, com a ameaça ao Estreito de Ormuz (o que poderia levar o planeta a mais uma crise do petróleo), o Império estadunidense tornou pública a presença de um bombardeio B52 escoltado por pelo menos seis jatos de combate, como ato de presença ostensiva. 

Antes do assassinato e martírio do Dr. Fakhrizadeh, o premiê de Israel, Benjamin Netanyahu, disse em conferência de imprensa dia 30 de abril de 2018, em Tel Aviv: “Lembrem-se deste nome”. No projetor, uma foto do cientista mais novo, talvez o único registro que o Mossad ou a cooperação com agências dos EUA tivesse até então conseguido. Logo após o atentado começou a circular mais informações sobre a vítima. Fakhrizadeh teria nascido em 1958, na cidade sagrada xiita de Qom, foi vice-ministro da Defesa e brigadeiro-geral da Guarda Revolucionária, fez doutorado em engenharia nuclear e lecionou na Universidade Imam Hussein, do Irã.

O Dr. Mohsen não foi o primeiro alvo desse tipo de acionar terrorista. Entre 2010 e 2012, cinco cientistas iranianos, todos do programa de desenvolvimento de energia nuclear, foram alvos de atentados. Dariush Rezaeinejad, também foi assassinado pelo mesmo método, em 23 de julho de 2011. Em 11 de janeiro de 2012, o então jovem professor Mostafa Ahmadi Roshan e seu motorista foram martirizados. O atentado de 2012 foi no mesmo período do segundo aniversário do martírio do professor universitário e cientista nuclear iraniano, Massoud Ali Mohammadi, que também foi assassinado em um ataque terrorista à bomba em Teerã, em janeiro de 2010.

Também em 2010 houve outro atentado, tendo como alvos a Fereidoun Abbassi Davani – que veio a se tornar diretor da Organização Iraniana de Energia Atômica – e seu colega Majid Shahriari. Davani sobreviveu, mas Shahriari faleceu, sendo martirizado. O modus operandi de todos estes atentados é praticamente o mesmo, sendo que o de 2020 foi ainda mais sofisticado. A operação total poderia ter incluído 62 pessoas em solo iraniano em todos os momentos do crime. Além da explosão de um carro bomba, os tiros que feriram de morte a Fakhrizadeh, também atingindo seu veículo blindado e a escolta, teriam sido disparados de uma metralhadora de combate acionada por sinal eletrônico

Se fôssemos listar o número de físicos, engenheiros e químicos de países árabes assassinados sob as circunstâncias mais que suspeitas, esses mártires cientistas se somariam aos mártires persas e a um conjunto de pesquisadores de países islâmicos. Podemos exemplificar com o martírio do engenheiro aeroespacial tunisiano Mohammed al-Zawari, após ser assassinado pelo Mossad em dezembro de 2016, na cidade de Sfaz, sudeste da Tunísia. Em abril de 2018, o engenheiro palestino Fadi al-Batsh foi assassinado na Malásia, também pela agência de espionagem israelense. Em agosto de 2018, o engenheiro e físico sírio Aziz Asbar foi assassinado e até o New York Times apontou Israel como autor do crime

Antes do assassinato e martírio do Dr. Fakhrizadeh, o premiê de Israel, Benjamin Netanyahu, disse em conferência, em Tel Aviv: “Lembrem-se deste nome”

Foreign Policy
Mohsen Fakhrizadeh era o principal cientista nuclear iraniano.

Se formos retroceder ainda mais no tempo, a lista é enorme: Samir Naguib (egípcio, 1967), Yahya al-Mashad (egípcio, 1980), Rammal Hassan Rammal (libanês), Gamal Hemdan (egípcio, 1993), Ibrahim al-Dhaheri (iraquiano, 2004). Como demonstrado, o número de cientistas martirizados ao serem assassinados pelo Mossad é grande

Outro crime supostamente cometido por Israel em conjunto com os EUA seria o assassinato do tenente-coronel da Força Aérea Brasileira, José Alberto Albano do Amarante, em agosto de 1981. Amarante também era engenheiro formado pelo Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) e responsável pelo desenvolvimento do programa nuclear brasileiro, à época em parceria com o Iraque. O padrão aqui seria ainda mais sofisticado, sendo o engenheiro atingido por uma leucemia advinda de envenenamento. Os inúteis da ditadura militar brasileira identificaram o agente do Mossad Samuel Gilliad mas, “misteriosamente”, o espião de Tel Aviv conseguiu fugir do país. Uma estranha “coincidência” se dá no fato do estado de São Paulo, onde Amarante residia (na cidade de São José dos Campos), ser governado na época por Paulo Salim Maluf, brasileiro de origem libanesa (de família melquita) e tristemente conhecido na colônia por apoiar as Forças Libanesas (em especial a Kataeb) na guerra civil do Líbano. 

Nenhuma potência tenta intervir no arsenal nuclear israelense

Em tese, toda a preocupação do Estado Colonial que promove apartheid contra a população palestina é precaver-se de que potenciais adversários desenvolvam tanto armas nucleares como mísseis balísticos de longo alcance. A prerrogativa de deter armas de destruição em massa no Oriente Médio seria apenas de Israel, através de uma cínica cumplicidade das potências ocidentais. Como é de amplo conhecimento, em outubro de 1973, a então premiê Golda Meir ameaçou um devastador ataque nuclear contra o Cairo e Damasco. Ou seja, desde a década de 1970 é certo que Israel detém armas nucleares. 

Nove países, atualmente, são detentores de arsenais nucleares: EUA, Rússia, China, Índia, Paquistão, França, Reino Unido, Coreia do Norte e Israel. Sinceramente, não me recordo de ameaças por parte de nenhum país em retalhar, promover bloqueio ou a presença ostensiva da Agência Internacional de Energia Atômica nas dependências de alta segurança em Israel. Em março de 2015, em pleno esforço diplomático para um acordo nuclear com o Irã, o general Collin Powell, afro-americano do Partido Republicano que alcançou os mais altos postos de comando nas forças armadas e na hierarquia do governo do Império, comentou em um e-mail privado que estimava ser da ordem de 200 mísseis o arsenal nuclear israelense. Outras estimativas também estadunidenses supõem em 300 mísseis (incluindo de lançamento submarino) o total sob o controle de Tel Aviv. 

O cinismo dos criminosos

No jogo do cinismo no Sistema Internacional, o intelectual judeu estadunidense e antissionista Noam Chomsky nos explica que os poderes de fato pressupõem a existência de uma “estratégia de propaganda e agenda”, em que haveria “ideias pensáveis” e outras nem tanto. Logo, por razões inconfessáveis de interesses imperialistas e motivações absurdas e milenaristas, o Estado Colonial do Apartheid de Israel teria o direito de fazer o que bem entendesse, desde que mantivesse a aliança com os EUA, em especial com o núcleo mais duro de sua oligarquia e da cadeia de comando no complexo industrial-tecnológico-militar. 

Enquanto isso, os países árabes e islâmicos solidários à Causa Palestina terão de se esforçar cada vez mais em seu desenvolvimento científico, a começar protegendo a vida das equipes de pesquisa mais avançadas. Esperamos que o martírio do Dr. Mohsen Fakhrizadeh não fique impune e que deixemos de enterrar nossos cientistas. A única certeza no apoio da libertação da Palestina é que não há como recuar e nem sequer ter medo. Sigamos em luta.

* Artigo originalmente publicado no portal Monitor do Oriente Médio (monitordooriente.com) 

** Bruno Beaklini (Bruno Lima Rocha Beaklini) é militante socialista libertário de origem árabe-brasileiro e apoiador da libertação da Palestina desde antes da 1ª Intifada. 

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