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Evita é a poesia da rebelião dos povos. Sem ela, não haveria Perón nem peronismo na Argentina

Há 70 anos, morria o símbolo do mais importante movimento argentino e que iniciou o processo de transformações que garantiu direitos aos trabalhadores
Ilka Oliva Corado
Diálogos do Sul Global
São Paulo (SP)

Tradução:

Não há Perón sem Evita. Nem Perón nem o Peronismo existiriam sem Evita Perón. Evita é a poesia da rebelião dos povos.

A história tem sido ultrajada desde a idade da humanidade por seres patriarcais, misóginos, homofóbicos, racistas, classistas, xenofóbicos, e no caso particular da América Latina, seres de mentes colonizadas têm se encarregado de invisibilizar mulheres como Evita, que nunca aceitaram o jugo patriarcal e jamais dormiram sob o ronrom das delícias do poder e que, pelo contrário, foram suas maiores críticas.

Evita é a poesia da rebelião dos povos. O patriarcado que carece de ideologia a coloca na história como um ser passional, jamais a viu como um ser intelectual com um raciocínio de poucos e com uma coragem única. Os da esquerda dizem que é a alma e o coração do Peronismo, porque Perón foi a intelectualidade e a prudência. Nada mais longe da realidade, e é que as coisas devem ser ditas como são: Não há Perón sem Evita. Nem Perón nem o Peronismo existiriam sem Evita.

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Então, sem o patriarcado e sem uma história ultrajada pela misoginia, o que agora conhecemos como Peronismo deveria se chamar Evitismo ou Evitista, algo assim para fazer justiça e reivindicar quem foi a propulsora. Para sermos justos, Perón teve a sorte de encontrar em seu caminho uma mulher como Evita que o imortalizou ao sensibilizá-lo e aproximá-lo do povo e ao dar sua palavra e apoiá-lo diante dos párias, porque sem o respaldo de Evita, Perón teria sido só uma presidenta a mais.


E isso que é visto nas mulheres como passional, como alma e coração, nos homens é visto como intelectualidade e coragem, como voz de comando e estabilidade emocional; assim é o patriarcado. Então, Evita, uma das grandes mentes da América Latina, avançada por sua idade e sua época, é vista assim, como a alma e o coração do Peronismo. Nada mais injusto, porque é preciso ver seus pronunciamentos diante do povo, sua maneira de agir, ler seus textos para compreender sua genialidade para converter o complexo em algo completamente entendível para os operários que, como ela, não tiveram a oportunidade de frequentar uma universidade e empapar-se de livros e da educação superior e das oportunidades de desenvolvimento que, por exemplo, tiveram personagem como Perón, e que facilita o caminho da compreensão da política (nem sempre). Então, se a alma e o coração são tão importantes, por que o patriarcado que, repito não tem ideologia, não diz que Evita era a intelectual e Perón o passional?

Há 70 anos, morria o símbolo do mais importante movimento argentino e que iniciou o processo de transformações que garantiu direitos aos trabalhadores

Pinélides Aristóbulo Fusco – Wikimedia Commons

O patriarcado é o maior inimigo que temos, parece impossível vencê-lo, mas podemos erradicá-lo

Porque o lindo e grandioso da intelectualidade de Evita é que é natural, sua sensibilidade vem da pobreza e da miséria, de sua origem de pária e ela, mesmo carente das facilidades para aprender, pode pensar e sentir o que muitos diplomados de universidades com mestrado e doutorados não puderam. Não ficou por aí, essa análise ela o escreveu em numerosos textos e deu a conhecer em seus pronunciamentos e suas aproximações ao povo argentino. Passou da passividade à ação e é o que se necessita que façamos os seres humanos no mundo todo. Evita não se converteu em Evita ao se casar com Perón, já era e essa é a dívida do patriarcado, que pensa que Perón a converteu ao ter a “misericórdia” de vê-la e casar-se com ela e dar-lhe um sobrenome e uma posição econômica. Repito: o patriarcado não tem ideologia.

O dia que consigamos erradicar o patriarcado e a misoginia, mulheres como Evita serão reconhecidas por seu enorme aporte à luta dos direitos humanos e das políticas de desenvolvimento dos povos do mundo. Era tão, mas tão à frente para sua época, que jamais pensou em homens e mulheres, ou em gêneros, mas sim em seres humanos com os mesmos direitos.

O patriarcado é o maior inimigo que temos, parece impossível vencê-lo, mas podemos erradicá-lo, e então poderemos tornar a escrever a história e fazer justiça a tantas mulheres que lutaram pela liberdade de seus povos e foram invisibilizadas pela sombra de seus esposos, companheiros, amantes, pais, irmãos e seus sobrenomes.

A história e o patriarcado têm uma dívida com Evita. Algum dia ela será reconhecido como a alma, o coração e a intelectualidade de uma era que transformou a história da mulher na política argentina, latino-americana e mundial.

Já está na hora…

Ilka Oliva Corado é colaboradora da Diálogos do Sul em território estadunidense.

Publicado originalmente em 15/05/2018.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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Ilka Oliva Corado Nasceu em Comapa, Jutiapa, Guatemala. É imigrante indocumentada em Chicago com mestrado em discriminação e racismo, é escritora e poetisa

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