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ToggleUm marinheiro do porta-aviões nuclear USS Theodore Roosevelt, cujo comandante Brett Crozier foi demitido no princípio deste mês após advertir de potenciais consequências mortais por falta de atenção dos altos comandos à emergência de contágios de coronavírus em sua nave no Pacífico, faleceu nesta segunda-feira (13) de Covid-19.
O marinheiro morreu depois de ser trasladado para receber cuidados intensivos na quinta-feira da semana passada (9); foi o primeiro militar na ativa a falecer nesta pandemia, reportou a Marinha dos Estados Unidos. Grande parte da tripulação de 4800 marinheiros do Roosevelt já desembarcou em Guam – onde está ancorado desde 27 de março – para ser submetida a exames e colocada em quarentena; 10 deles já estão hospitalizados.
O secretário de Defesa, Mark Esper, lamentou a morte, assegurando que o Pentágono mantém seu compromisso com a proteção de seu pessoal durante esta pandemia.
Mas a notícia aprofundou a atenção pública sobre a pandemia dentro das forças armadas depois que o manejo do brote no Roosevelt, com 585 tripulantes contagiados representando mais da metade dos casos entre militares, não só custou o posto ao comandante do barco, mas também ao secretário da Marinha.
O capitão Brett Crozier, comandante do Roosevelt com mais de 30 anos no serviço naval, foi dispensado em 2 de abril por ordem do secretário interino da Marinha, Thomas Modly, depois de tornar-se pública sua carta enviada dois dias antes expressando preocupação pelo manejo da crise de saúde em seu navio por seus superiores em Washington.
US Navy
Grande parte da tripulação de 4800 marinheiros do Roosevelt já desembarcou em Guam
“Marinheiros não necessitam morrer!”
Em sua carta solicitou “ação decisiva” recomendando licença para evacuar a maioria do pessoal e colocá-los em quarentena em terra firme. “Não estamos em guerra. Marinheiros não necessitam morrer”, advertiu.
Modly e outros suspeitaram que Crozier havia vazado a carta aos meios para pressioná-lo, mas também se preocuparam pela reação do comandante em chefe Donald Trump com sua narrativa de que está tudo “sob controle”.
Modly justificou sua decisão acusando Crozier de agir indevidamente ao enviar sua carta por correio eletrônico a mais de 20 pessoas, de não saber manejar a crise em sua nave de “uma maneira profissional”, e que não só prejudicou seus superiores, mas que poderia até ter beneficiado “adversários” dos Estados Unidos ao criar “pânico” e dúvidas sobre a capacidade militar estadunidense. Insistiu em que não era um caso de “matar o mensageiro”.
Mas cinco dias depois de afastar Crozier, Modly foi obrigada a apresentar sua renúncia.
É que Modly – em uma viagem que custou mais de 200 mil dólares em fundos públicos – decidiu ir à Guam há uma semana para fazer um breve discurso à tripulação do Roosevelt, que havia se despedido seu capitão com uma ovação dias antes. O secretário questionou o caráter do agora ex-capitão culminando com a acusação de que Crozier havia vazado sua carta aos meios de comunicação ou que era “demasiado naif ou demasiado estúpido para ser comandante de uma nave como esta”. Também advertiu a tripulação para não falar com a imprensa.
As palavras, vazadas a meios de comunicação horas depois, provocaram ira entre a tripulação e entre seus familiares, e denúncias de políticos democratas e comentaristas.
Na último dia 6, Modly, em uma tentativa de salvar-se, difundiu um pedido de desculpas pública por seu insultos a Crozier, embora continuasse insistindo que o capitão vazou sua carta aos meios. Não foi suficiente, e na terça-feira Modly apresentou sua renúncia ao secretário de Defesa Esper.
O comandante em chefe, Donald Trump, que inicialmente apoiou Modly e denunciou a carta de Crozier, comentou na semana passada, depois do aparecimento dos comentários no porta-aviões, que não conhecia pessoalmente seu agora renunciado secretário da Marinha, mas que ele também teria solicitado sua renúncia.
Onze dias após ser demitido por tentar proteger sua tripulação, o aviso do capitão Crozier se tornou realidade com a morte do marinheiro.
David Brooks, correspondente de La Jornada em Nova York.
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Tradução: Beatriz Cannabrava
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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