Pesquisar
Pesquisar
Foto: Luis Arce / Facebook

Bolívia retoma “normalidade”, mas versões sobre ato golpista aumentam divisão da sociedade

Arce e Morales, principais líderes do Movimento ao Socialismo (MAS), seguem em uma disputa feroz pela candidatura presidencial em 2025
Aldo Anfossi
La Jornada
La Paz

Tradução:

Beatriz Cannabrava

Na tarde desta quarta-feira (3), a Plaza Murillo, centro geográfico do poder político na Bolívia, estava cheia de civismo: mães caminhando de mãos dadas com seus filhos que alimentavam as inevitáveis pombas, velhas avós indígenas vestidas com suas roupas multicoloridas mascando folhas de coca e com celulares nos ouvidos, vendedores ambulantes oferecendo leitão assado, homens divagando sabe-se lá sobre o quê, turistas europeus agitados e resistindo ao efeito implacável da altitude de La Paz.

Essa aparente normalidade poderia ser um efeito fantasma.

Porque, uma semana após o fracassado golpe de Estado para derrubar o presidente Luis Arce, a sociedade boliviana parece mais dividida do que nunca em torno de se a mobilização de tropas que entraram à força no Palácio Quemado para tomar o poder, sob comando do chefe do exército, general Juan José Zúñiga, foi ou não um “autogolpe” orquestrado entre ambos os personagens.

Leia também | Bolívia: Arce e Evo rebatem Milei, rechaçam ingerência e denunciam “ideologia fascista”

Desde que controlou a intentona, o governo prendeu cerca de 30 militares e civis acusados de planejar e executar o levante; e diariamente informa sobre mais diligências policiais e judiciais realizadas, entre elas a invasão e inspeção de quartéis militares, para decifrar a profundidade do assalto.

Houve ou não acordo prévio?

O objetivo sedicioso, segundo Zúñiga ao recuar, foi previamente acordado com Arce e consistia em fingir um assalto ao poder para favorecer a popularidade do governo, castigada pelos problemas econômicos do país. Zúñiga, que foi encarcerado e obrigado por Arce a retroceder, está agora preso na penitenciária de El Abra, em Cochabamba, acusado de terrorismo e levante armado.

Apesar de a versão do autogolpe ser negada rotundamente por Arce – “eu não sou um político que vai ganhar popularidade com o sangue do povo, muito pelo contrário, nós viemos reivindicar esse povo boliviano que deu seu sangue para recuperar a democracia” – paulatinamente aquilo se instalou no coletivo social. Seu principal impulsionador é quem foi seu correligionário, hoje transformado em seu pior inimigo, o ex-presidente Evo Morales. “Lucho mentiu, enganou o povo boliviano e o mundo inteiro com este golpe ou autogolpe”, chegou a dizer e não para de repetir.

Leia também | Candidatura intermediária é única forma de reunir Evo e Arce, defende analista política da Bolívia

Arce e Morales, principais líderes do oficialista Movimento ao Socialismo (MAS), estão em uma disputa feroz por conseguir a candidatura presidencial de 2025, sem solução e aprofundada após os acontecimentos. Na terça-feira (2), o presidente publicou uma declaração em suas redes sociais afirmando que “apesar dos interesses mesquinhos e ambições pessoais que querem impedir que continuemos trabalhando pelo bem-estar de todas e todos os bolivianos, e apesar da tristeza pelo obscuro episódio ocorrido na semana passada, estamos e continuaremos firmes trabalhando pelo bem-estar do nosso povo, goste quem gostar”.

Na próxima semana, o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva virá ao país, aterrissando em Santa Cruz, para se reunir com Arce e com empresários ansiosos para que a Bolívia seja aceita no Mercosul. Lula havia dito que tinha a intenção de se reunir com Morales, mas na quarta-feira a chancelaria brasileiro precisou que “não está prevista uma reunião com Evo Morales, com quem Lula tem uma excelente relação”.

Assine nossa newsletter e receba este e outros conteúdos direto no seu e-mail.

Alguns aqui viam nisso uma possível mediação entre Evo e Lucho, como chamam o presidente, mas isso ainda está pendente.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Aldo Anfossi

LEIA tAMBÉM

Genocídio e genocidas um tema do presente, passado e futuro
Genocídio e genocidas: um tema do presente, passado e futuro
Dina Boluarte - desqualificada para governar, expert em obstruir a justiça
Dina Boluarte: desqualificada para governar, expert em obstruir a justiça
Chile processa general que “facilitou” crimes de policiais durante protestos de 2019
Chile processa general que “facilitou” crimes de policiais durante protestos de 2019
Espanha deve pedir perdão ao México e abandonar desmemoria, afirma historiador
“Espanha deve pedir perdão ao México e abandonar desmemória”, afirma historiador