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Brooks: Não há quem se preocupe mais com sua maquiagem pós-golpe do que os EUA

Não se trata de orgulho nacional, como em outros, mas é expressão de que este é o “país indispensável” escolhido por Deus, para ser o “farol da democracia”
David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

A Estátua da Liberdade escondeu sua cabeça em suas mãos na quarta-feira desejando que ninguém estivesse vendo as forças neonazistas, racistas, anti-imigrantes, nostálgicos da confederação escravocrata, caçadores de esquerdistas, entre outros que diziam que tomaram por assalto o Capitólio ao responder o chamado de Trump; alguns buscaram tomar legisladores como reféns, matar jornalistas (conforme deixaram escrito em portas) e talvez enforcar uns quantos (haviam instalado uma forca no jardim de fora). O presidente disse que “gostamos muito deles”. 

Trump agora está acusado de incitar violência contra o governo para descarrilar o processo democrático.

Entre as primeiras reações de incredulidade, pânico, fúria e tristeza havia outra algo curiosa: o que pensarão de nós no resto do mundo?

É difícil imaginar a qualquer outro país no meio de uma tentativa de golpe por “terroristas domésticos” que se preocupe tanto sobre sua maquiagem e imagem entre suas primeiras preocupações, mas os Estados Unidos talvez sejam o país mais vaidoso do mundo.  

Não se trata de orgulho nacional, como em outros, mas é expressão do mito oficial do chamado “excepcionalismo americano” de que este é o “país indispensável” aparentemente escolhido por Deus, para ser não só o guardião da ordem mundial, mas sim o “farol da liberdade” ou “da democracia”.  

De fato, diplomatas de carreira estadunidenses se queixaram esta semana de que o assalto ao Capitólio, incitado pelo presidente, mina gravemente sua credibilidade, em seus esforços de promoção da democracia em outros países e instaram o secretário de Estado Pompeo a que se somasse às iniciativas para destituir Trump. Argumentaram que da mesma forma como “denunciamos líderes estrangeiros que usam violência e intimidação para interferir em processos pacíficos democráticos”, deve-se fazer o mesmo com Trump, já que “é crítico que comuniquemos ao mundo que em nosso sistema ninguém – nem o presidente – está acima da lei”. 

Não se trata de orgulho nacional, como em outros, mas é expressão de que este é o “país indispensável” escolhido por Deus, para ser o “farol da democracia”

White House
Promessa de campanha de Joe Biden é “restaurar a liderança responsável dos Estados Unidos no cenário mundial”

Alguns duvidam que o país que se autoproclama como o líder do mundo – a promessa de campanha de Biden é “restaurar a liderança responsável dos Estados Unidos no cenário mundial” – poderá se dedicar à sua missão oficial de promover a democracia sem contar com uma democracia operativa em casa. Bom, isso se alguém acredita que democracia era a que promoviam os Estados Unidos.

Os acontecimentos da semana, afirma o filósofo Cornel West, levou a que aqueles estadunidenses “que se consideram civilizados em relação aos selvagens, aos bárbaros (em outras partes do mundo) percebessem que a selvageria está dentro de nós mesmos neste país”. Sublinhou que este país é um experimento democrático dentro de um império construído sobre a destruição dos povos indígenas, da escravidão de africanos, dos imigrantes e da exploração dos trabalhadores. 

West assinala que esta crise é muito mais antiga que Trump, “uma profunda história de forças bárbaras neste país que sempre vivem só debaixo de sua superfície”. Nestes dias também se têm que enfatizar que essas forças bárbaras operam com a cumplicidade, ou às vezes são manipuladas, pelas elites como têm sido ao longo desta presidência.  

Nunca foi resolvida a contradição fundamental dentro dos Estados Unidos entre seu projeto democrático e seu império, tema para outro momento. 

Mas vale ressaltar que também há uma longa tradição de luta por civilizar e democratizar este país, com uma história nobre e que agora determinará se os Estados Unidos serão resgatados ou não das forças mais escuras desatadas pelos neofacistas e seus cúmplices. 

Essa é a mesma luta contra os bárbaros direitistas – muitos disfarçados em finos trajes e com as melhores credenciais – em outros países. Para triunfar requerem da solidariedade de ambos os lados das fronteiras. É hora de que, uma vez mais, se apresentem sem vaidades. 

La Jornada, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.

Tradução: Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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