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Processo de impeachment de Trump expõe a todo o mundo suposta traição aos EUA

Documentos oficiais divulgados hoje parecem confirmar que Trump solicitou a ajuda de um poder estrangeiro para atacar um adversário
David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

De repente, toda a atenção deslocou-se das reuniões mundiais na Organização das Nações Unidas para Washington, onde teve início o complexo e incerto processo de destituição presidencial, o impeachment, apenas pela quarta vez na história dos Estados Unidos, deixando Donald Trump, ante literalmente todo o mundo, acusado de trair seu país.

Documentos oficiais divulgados hoje parecem confirmar que Trump solicitou a ajuda de um poder estrangeiro para atacar um adversário político dentro de seu próprio país, algo que a liderança democrata qualificou como “uma traição” ao divulgar o início do processo de impeachment na terça-feira.

A Casa Branca, ao buscar a forma de responder diante de mais um escândalo político, divulgou hoje publicamente uma transcrição parcial resumida da chamada telefônica entre Trump e o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, em julho. “Eu gostaria que nos fizesse um favor”, diz Trump, comentando que “nosso país tem passado por muita coisa e a Ucrânia sabe muito sobre isso”. Menciona possíveis investigações conjuntas, sugerindo que o ucraniano trabalhe com Rudolph Giuliani (que se desempenha como advogado e assessor pessoal de Trump, mas não trabalha para o governo) como também com o procurador geral dos Estados Unidos, William Barr, para indagar versões de que Joe Biden havia brecado um promotor ucraniano que investigava seu filho que era membro da junta diretora de uma empresa de gás ucraniana.

“Há muita conversa sobre o filho de Biden, que Biden freou a investigação e que muita gente quer averiguar mais sobre isso, então o que possas fazer com o procurador geral [Barr] seria muito bom”, disse Trump ao seu par ucraniano.  

Documentos oficiais divulgados hoje parecem confirmar que Trump solicitou a ajuda de um poder estrangeiro para atacar um adversário

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Trump pode sofrer impeachment

O filho de Biden foi integrante da junta diretora de uma empresa ucraniana quando seu pai era vice-presidente. 

Trump e outros republicanos ressaltaram hoje que a transcrição confirma que não houve nenhuma pressão sobre o ucraniano – embora o estadunidense tenha ordenado congelar quase 400 milhões de dólares em assistência estadunidense a esse país em semanas prévias ao telefonema – nem algo ilegal ou impróprio já que seu único interesse era indagar sobre possíveis atos de corrupção. 

Mas a presidenta da câmara baixa e a democrata mais poderosa de Washington, Nancy Pelosi, disse hoje que a conversação confirma que o comportamento de Trump “mina a integridade de nossas eleições, a dignidade do posto e a nossa segurança nacional… e isto confirma a necessidade de um processo de impeachment”.

Trump denunciou ontem à noite a decisão e esta tarde em uma entrevista coletiva originalmente programada para festejar suas sempre “grandiosas” conquistas na ONU, qualificou como “broma” que essa conversação telefônica “perfeita” com o ucraniano fosse motivo de um impeachment. Denunciou que é outro “engano” nutrido por “fake news” e parte da incessante “caça de bruxas” contra ele desde que ganhou as eleições, impulsionada por democratas aos quais “não lhes importa o país”, mas só o poder. Acusou: “já que não podem ganhar contra mim eleitoralmente, optam por destituir-me”.  

Como costuma fazer, lançou sua contraofensiva acusando a Biden e os democratas de lucrar com a corrupção na Ucrânia, e exigiu “transparência” por parte do ex-presidente e todos seus sócios. 

Em uma reunião com Trump em Nova York à margem da Assembleia Geral, um muito incomodado Zelensky comentou que não desejava envolver-se no processo eleitoral estadunidense e qualificou o telefonema como “normal”, onde ninguém “me forçou”. Trump lhe ajudou a traduzir sua mensagem: “em outras palavras, não houve pressão e sabem que não houve pressão”. 

Por sua vez, o escritório do diretor interino de Inteligência Nacional, Joseph Maguire, entregou a alguns legisladores o informe classificado que um denunciante confidencial, por agora só identificado como um oficial de inteligência, entregou a seus chefes, e esta noite alguns com acesso a esse informe indicaram que havia detalhes ainda mais preocupantes do que os que estão na transcrição telefônica, e solicitaram que seja divulgado ao público. 

Aparentemente, a Casa Branca — dentro da qual se reportam intensos debates sobre como responder a esse último escândalo – decidiu que a melhor opção era revelar a conversação já que não contém o que alguns suspeitavam, uma negociação explícita de liberar os fundos congelados em troca da investigação ucraniana, mas também evitar que sejam acusados de uma tentativa de encobrir outra coisa mais.  

O próprio presidente, seus aliados no Senado, e alguns estrategistas estão tratando de convencer, e talvez de convencer-se a si mesmos, de que o impeachment afinal será benéfico para a campanha de reeleição, já que, argumentaram em público, gerará maior motivação entre suas fileiras contra o que chama a continuação de “caça às bruxas” pelos democratas.  

Mas Trump parece estar oscilando entre isso e uma sensação de alarme. 

Por seu lado, Biden emitiu uma declaração acusando Trump de pôr “seus interesses políticos sobre nosso interesse de segurança nacional… isto é uma prova para nossos valores democráticos”.

Antes das novas revelações, que surgiram depois do alerta formal apresentado aos seus chefes dentro do governo pelo denunciante confidencial, o debate entre democratas era se deviam proceder com o impeachment com base nas investigações já em curso no Congresso. 

Pelosi e outros haviam argumentado que não existia o apoio necessário da opinião pública para isso e menos a possibilidade do apoio dos dois partidos para conseguir a destituição do presidente e que no final tudo isso poderia ter consequências eleitorais negativas para os democratas em 2020. 

Mas com as novas revelações, hoje quase toda a bancada democrata se expressou a favor de proceder com o processo de destituição.   

Esse processo já foi iniciado, e os seis comitês da câmara que já estavam investigando Trump começarão a formular seus casos sobre violações que são causa de impeachment sob a Constituição para entregá-los ao Comitê Judicial. Se forem aprovados no plenário da câmara baixa, o processo irá ao Senado que, se os republicanos no controle aceitarem proceder (algo que por agora está quase descartado) funcionará como tribunal para o julgamento político de Trump.

*Correspondente La Jornada em Nova York

**Tradução: Beatriz Cannabrava

***La Jornada, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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