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Fotos: Freddy Eduardo (Glas) / Eduardo Santillán (Noboa)

Ordem de invadir embaixada do México partiu de Noboa; Glas corre risco de vida, afirma defesa

Familiares reiteram denúncias e afirmam que ex-presidente sofreu overdose de ansiolíticos, antidepressivos e sedativos
Orlando Pérez
La Jornada
Quito

Tradução:

Beatriz Cannabrava

O ex-vice-presidente equatoriano Jorge Glas Espinel completará 55 anos em setembro, sendo que cinco deles passou detido nas prisões do Equador, em Quito e Latacunga. E agora está na de maior segurança, denominada La Roca, na cidade de Guayaquil. Em todo esse tempo sua saúde se deteriorou. Tem recebido tratamento médico regular e – tal como comentou ao autor desta nota em uma entrevista passada – tomava diariamente 48 comprimidos de todo tipo, para diversas doenças. Ao ingressar em La Roca no sábado passado (6), requeria desses medicamentos, mas não todos os que necessitava lhe foram providenciados. Nesta segunda-feira (8) se soube que desde domingo sofria uma intoxicação intestinal por medicamentos, e nesta segunda-feira primeiro foi trasladado ao hospital do Exército e depois ao hospital Naval.

Outra versão destaca que foi produto de uma overdose de ansiolíticos, antidepressivos e sedativos, segundo o testemunho reservado de um de seus familiares. Seu advogado, Andrés Villegas, denunciou os atropelos e violações aos direitos humanos a que foi submetido. “Reiteramos que sua vida corre perigo, como denunciaram na sexta-feira passada as autoridades da Embaixada do México em Quito, da qual Jorge Glas foi tirado violenta e ilegalmente”, indicou. Contou, além disso, que nesta segunda-feira acudiu, às 13:30, à prisão La Roca. Mas não o deixaram passar pelos filtros de segurança.

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Depois foi atendido pelo diretor da prisão, que lhe contou que depois da contagem habitual dos presos, Jorge Glas não apareceu. E, ao ingressar em sua cela, foi encontrado desmaiado. “Nunca comunicaram a ninguém. Não me deram mais detalhes. Depois, o diretor da prisão me informou que depois do meio-dia ‘havia sido transferido ao Hospital Militar”. Por sua vez, o Serviço Nacional de Atendimento a Pessoas Privadas de Liberdade, em um comunicado, indicou que Glas não quis ingerir alimentos durante todo o domingo. Villegas presume que, além disso, tomou uma overdose do remédio para dormir. “Hoje pela manhã os guias informaram a situação e o pessoal de saúde acudiu imediatamente, verificaram seus sinais vitais e depois deram a ordem de levá-lo a uma casa de saúde”.

Ante isto, responsabilizou a juíza que legalizou a detenção do ex-vice-presidente, que se encontrava asilado na Embaixada do México. Também responsabilizou a Polícia Nacional pela vida de seu defendido: “Responsabilizamos o Governo do presidente Noboa pela saúde de Jorge Glas. Anunciamos todas as ações legais pertinentes para conseguir sua libertação e que não seja uma vítima a mais da perseguição política deste regime, que inicia uma série de ações ilegais e atentatórias contra a democracia justamente no dia em que arranca uma campanha para a Consulta Popular”, indicou. Além disso, em 6 de dezembro de 2022, o ex-vice-presidente Glas foi submetido a uma cirurgia na cervical, depois de sair em liberdade no passado 28 de novembro desse mesmo ano, após uma medida cautelar de um juiz que depois foi destituído.

Essa operação é delicada e requer cuidados e tratamento regular. Na detenção na embaixada do México, ao resistir, haveria sido afetada a cervical e isso também lhe impedia de se mover com facilidade. Ademais dos golpes nas pernas que lhe teriam sido feitos por seus captores.

Noboa ordenou assaltar a embaixada do México custe o que custar

Em reconhecimento tácito de que o Equador violou a Convenção de Viena sobre relações diplomáticas e consulares, a chanceler deste país, Gabriela Sonmmerfeld, afirmou que foi o próprio Daniel Noboa quem ordenou ingressar à embaixada do México em Quito, para deter o ex-vice-presidente Jorge Glas.

Consequências da invasão

Ademais, em entrevista a um canal local, reconheceu que seu governo está consciente das consequências dessa incursão que viola convênios internacionais. E ao ser consultada porque não se deteve Glas fora da embaixada, no veículo que podia levar Glas ao aeroporto, assinalou: “Viola o mesmo artigo”, referência ao 22 da Convenção de Viena que diz: “Os agentes do Estado receptor não poderão penetrar nelas (as sedes diplomáticas)… e demais bens assim como os meios de transporte da missão”. E poucas horas depois, três dias depois do assalto, Noboa rompeu o silêncio.

Após reiterar que o país atravessa uma situação complexa e sem precedentes, “tomei decisões excepcionais para proteger a segurança nacional, o Estado de Direito e a dignidade de um povo”, indicou em um comunicado [dirigido à cidadania e à comunidade internacional] que publicou em sua conta da rede social X. Então justificou a ação contra a soberania mexicana, ao destacar que “não podíamos permitir que se asilem delinquentes sentenciados, envolvidos em crimes muito graves, violando o Artigo III do Acordo de Caracas, o Artigo I da Convenção de Montevidéu e o Artigo 41 da Convenção de Viena, ou se corra o risco iminente de sua fuga, como nos passou antes, e se burlem novamente do povo equatoriano.

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É claro que Noboa pôs na frente que “nós estamos jogando o país” e se se referiu à sua consulta popular. Disse que as críticas contra ele são falsas e que a grande maioria dos equatorianos votará pela dignidade nacional na consulta popular de 21 de abril”. E arrematou com uma mensagem que deixou mais confusões: ao dizer que está disposto a resolver qualquer diferença, com uma condição: “A justiça não se negocia, e jamais deve proteger criminosos que fizeram dano aos mexicanos”. Sem mencionar a Glas, disse que “todo delinquente cumpra sua pena na prisão, custe o que custar”.

Militarização

Todas estas declarações foram dadas no marco de um novo decreto presidencial emitido na noite deste domingo (7), no qual Noboa reconhece a persistência de um conflito armado interno. E o faz, depois que o estado de exceção, decretado em janeiro passado, chegou ao seu fim, pois a Constituição equatoriana impede o uso dessa ferramenta legal indefinidamente. Esse alerta afirma que ainda há grupos armados organizados que mantêm hostilidades no país, de acordo a informe do Centro de Inteligência Estratégico, entidade que realizará “periodicamente uma atuação individualizada destes”.

E nesse sentido dispôs às seguintes instituições: Às Forças Armadas: Executar operações militares para “prevenir e erradicar a atividade de grupos armados organizados no território nacional”. À Polícia e às Forças Armadas: continuar com o despegue operacional e tático requerido para neutralizar os ataques armados, ameaças ou riscos orquestrados pelo crime organizado, grupos armados organizados ou terroristas. Além disso, a coordenação é necessária para estabelecer uma programação orçamentária plurianual a respeito da segurança interna, sistemas de inteligência estratégica e de contrainteligência, entre outros.

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Além disso, Noboa decretou as prisões como zonas de segurança, como já fez no passado 7 de março, quando estendeu por 30 dias o estado de exceção que começou em janeiro. Com isto, o toque de recolher e outras medidas, como a restrição de mobilidade e a incursão da força pública nos domicílios, sem necessidade de uma ordem judicial, ficam suspensas. Na prática, policiais e militares seguiram agindo no combate contra os grupos criminosos, decisão que não está respaldada na Constituição e que Noboa colocou para a Consulta Popular, deste 21 de abril, essa opção para que a cidadania referende essa atribuição.

Os analistas jurídicos disseram na segunda-feira que se poderia demandar a inconstitucionalidade do decreto, mas como restam poucos dias para a Consulta, bem se poderia esperar os resultados dela e depois proceder a favor ou contra a demanda. Até o momento, segundo um comunicado das Forças Armadas do Equador, emitido em 8 de abril, se realizaram 272 mil operações no nível nacional, “resgatando uma grande quantidade de armas, munições e explosivos… mais de 77 mil quilos de substâncias catalogadas sujeitas à fiscalização e 140 mil galões de combustível”.

No entanto, desde a declaratória do “conflito armado interno”, as estatísticas mostram um incremento dos assassinatos violentos, dos sequestros e das extorsões. Isso sim, se pode ter controle sobre as prisões, que foram o foco de maior atenção mundial durante todo o ano de 2023, pela série de motins e massacres carcerários.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.
Orlando Pérez Correspondente do La Jornada em Quito.

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