Desde que explodiu a pandemia do Covid-19 na Espanha foram curados até a presente data em torno de dois de cada dez infectados. Isto é, de um total de quase 80 mil pessoas que formam parte das estatísticas oficiais como “contagiados”, já tiveram alta 16.780, entre os quais há jovens e idosos, mulheres e homens, ricos e pobres, esportistas e sedentários, do sul e do norte do país.
Em plena crise sanitária, com quase sete mil mortos e os piores dias ainda por chegar, o rosto e a voz dos sobreviventes do Covid-19 são um alento de esperança para os que continuam lutando, em hospitais e casas, para derrotar a doença.
“Depois de uma viagem por Malta comecei a me sentir mal. Não muito, simplesmente me custava respirar, perdi de repente o sentido do olfato, e, portanto, o paladar, e tinha tonturas leves. Não dei demasiada importância, até que suspeitei que tinha a doença e que era um risco para minha própria família”, relatou a La Jornada Javier Aguinaga, um engenheiro originário de Burgos que mora em Madri e que venceu a pandemia, quase um mês depois de haver sentido os primeiros sintomas.
Javier, como tantos milhares de doentes, não foi submetido ao teste e nem sequer foi atendido pelos médicos. Simplesmente preencheu um formulário em um aplicativo no celular, fez uma chamada ao número de atendimento dos potenciais pacientes e ficou em casa fazendo repouso e tomando paracetamol para aliviar os sintomas.
SIC
Já são 16.780 pessoas consideradas "curadas" no país.
Diferentemente de Javier, Alfonso Reyes, um ex-jogador de basquete profissional e o atual presidente da Associação de Basquetebolistas profissionais (ABP), teve que ser internado na Unidade de Cuidados Intensivos de um hospital madrilenho. Esteve gravemente doente. Muito gravemente, mas finalmente conseguiu sair da crise e teve alta na quinta-feira passada. “Os primeiros dias foram duríssimos. Ainda tenho tosse, mal estar e segundo me explicaram os médicos o puta bicho que se meteu no meu corpo vai ficar ainda pelo menos mais.15 dias Assim que saio do hospital e vou para casa, mas terei que ficar isolado da família outras duas semanas”, relata.
Em sua convalescença, Reyes, de 48 anos e com quase dois metros de altura perdeu até oito quilos de peso e viveu momentos de penumbra nos quais viu a morte de perto. Seu contágio ele o atribuiu a uma viagem a Milão que fez seu irmão, Felipe Reyes, jogador do time profissional do Real Madri de basquete, mas ninguém sabe com certeza.
“Continuo isolado. Em um quarto com banheiro. Deixam a comida na porta, e tenho um terraço ao que posso sair e de onde posso me comunicar, a uma distância prudente, com minha família. Estive muito preocupado até que me internaram no hospital, uma vez ali, você sabe que está bem atendido e medicado e só pensa em derrotar o bicho. Foi muito duro. Creio que foi a maior prova que a vida me apresentou. Pois, como lhe digo eu, o filho da puta é um inimigo muito poderoso, cruel, traiçoeiro e tremendamente persistente”, expõe Reyes.
Oscar López é um médico andaluz que teve que se enfrentar à pandemia desde a primeira frente de batalha, ou seja, das emergências e do atendimento direto aos doentes que não deixam de chegar aos hospitais espanhóis. A carência de meios básicos para evitar o contágio, como máscaras e luvas, poderia ser o motivo de seu contágio, que além de submetê-lo a uma quarentena difícil e tortuosa também provocou a supressão de um elemento na sanidade espanhola. “Os médicos estivemos na primeira linha da batalha nesta guerra. Especialmente, os médicos de urgências hospitalares e ambulatoriais, como é o meu caso. Que eu tenha que atender 40 ou 50 pacientes diferentes por dia em meu consultório faz com que a probabilidade se incremente exponencialmente. No meu caso, eu creio que o contágio, embora seja ainda um mistério, produziu-se no início da pandemia, talvez com algum positivo assintomático”.
Embora a maioria das pessoas que se curam da doença em média têm menos de 65 anos, Carlos Bueno, um aposentado de 86 anos, converteu-se em motivo de orgulho do Hospital Universitário de La Paz, em Madri, quando saiu caminhando na última quinta-feira depois de haver estado dez dias em estado crítico. Seu filho relatou que seu pai “esteve lutando contra o coronavírus por mais de duas semanas e finalmente foi capaz de vencê-lo, com seus quase 90 anos. É muito forte, mas sem dúvida saiu dessa graças ao atendimento profissional e à entrega da equipe médica, à qual toda a família estaremos eternamente agradecidos”.
Outro sobrevivente do Covid-19 é Pedro Alfaro, que teve alta há só quatro dias e já está em casa, isolado do resto de sua família, mas fora de perigo. “Notei mal-estar de corpo, parecido a uma gripe normal, salvo com um pequeno detalhe: perdi o olfato. Isso não se sabia, mas agora se sabe que sim, que é um dos possíveis sintomas. Fui internado após fazer uma radiografia e um exame de sangue. Estive em observação. Me deixaram ali porque sabiam que ia ter uma recaída por causa dos resultados. Graças a isso não foi pior e me trataram com retrovirais e por isso hoje posso contar”.
Um caso parecido ao de Nil Monró, estudante de publicidade em Barcelona e um dos primeiro pacientes registrados com a doença, que se havia contagiado em Milão durante uma viagem. “Os sintomas foram diversos e se manifestaram em intensidades diferentes ao longo de toda a doença. Febre, mal estar geral, catarro, garganta seca, tonturas, náuseas, dores musculares e nas articulações. Tentei me manter o mais positivo possível embora também me permiti chorar, pois o confinamento é estranho, ainda estou assimilando tudo isso”.
Todos eles formam parte do motivo por que lutam nas emergências e nas alas mais dramáticas dos hospitais espanhóis milhares de pessoas da área médica que se converteram nos heróis do país. Por isso a cada dia, às oito da noite, em todas as cidades do país e praticamente em todos os balcões e terraços lhes é presenteado um emotivo aplauso de mais de cinco minutos. É um dos momentos mais esperados de um país em luto.
Armando G. Tejeda correspondente de La Jornada em Madri
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Tradução: Beatriz Cannabrava
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