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O Vice-Primeiro Ministro para Assuntos Econômicos do Afeganistão, Mullah Abdul Ghani Baradar Akhund, e representantes da ONU (Foto: Porta-voz do Emirado Islâmico do Afeganistão / X)

Afeganistão: os desafios internos e externos após 3 anos de governo Talibã

Incerteza é a palavra de ordem no atual Afeganistão, que busca reverter uma grave crise humanitária e conseguir o reconhecimento político internacional
Nicholas Valdes
Prensa Latina
Havana

Tradução:

Ana Corbisier

O Emirado Islâmico, como se autodenomina o governo Talibã, assumiu novamente o controle do Afeganistão há três anos, pondo fim a duas décadas de ocupação dos Estados Unidos e de seus aliados da Otan.

A saída das tropas estadunidenses, em agosto de 2021, marcou uma das mudanças políticas mais significativas na história deste país, pois o Talibã endureceu suas ações contra as forças do governo imposto por Washington e, depois de 15 dias, todo o país ficou sob seu controle quase sem resistência.

O porta-voz do Emirado Islâmico, Zabihullah Mujahid.

O que segue já é história, e hoje, as políticas exterior e interior do Emirado Islâmico durante seu terceiro aniversário no poder continuam experimentando numerosos altos e baixos.

Interino e não reconhecido

O governo do Afeganistão — que ainda é de caráter interino — não foi reconhecido pela imensa maioria da comunidade internacional, embora seja um fato que ampliou suas interações com países da região e além. As relações estabelecidas com alguns Estados e a ativação de representações em vários países, com o envio de embaixadores e altos funcionários, são considerados aspectos importantes da política exterior dos talibãs.

Não obstante, grande parte da comunidade internacional mantém sua posição de que o reconhecimento deste governo está sujeito à observação dos direitos humanos (especialmente os das mulheres), a formação de um governo oficial e inclusivo e um diálogo nacional, além da luta contra o terrorismo e as drogas. “Querem legitimidade como poder governante no Afeganistão, mas como se pode governar e ter uma economia eficaz quando basicamente a metade da força de trabalho do país (todas as mulheres) é proibida de ser parte deste processo. Se querem reconhecimento precisam cumprir seus compromissos”, declarou a Comissão Europeia em um comunicado.

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“O Emirado Islâmico considera estas condições internacionais assuntos internos do Afeganistão e pediu ao resto do mundo que não interfira. A questão de um governo inclusivo é um assunto nosso; as decisões são baseadas nos interesses nacionais em todos os âmbitos. Os países da região e as nações distantes deveriam discutir como organizar suas relações com o Afeganistão e como podemos criar um entorno de cooperação”, afirmou a respeito o porta-voz do Emirado Islâmico, Zabihullah Mujahid.

Compromissos e responsabilidades dos EUA

A representante especial da China para o país vizinho, Yue Xiaoyong, declarou em outubro de 2023 que as comunidades regional e internacional devem pedir aos Estados Unidos que cumpram seus compromissos e responsabilidades. “Uma ocupação do Afeganistão durante 20 anos pelos Estados Unidos e a OTAN causou uma destruição quase total da nação islâmica. Washington e seus aliados cortaram a ajuda, congelaram ativos e impuseram sanções unilaterais, o que agravou os problemas que enfrenta o povo afegão”, afirmou a diplomata. Até agora, o Emirado Islâmico aumentou suas representações políticas para 39 e designou um embaixador oficial na China.

Em fevereiro de 2024, o Ministério de Assuntos Exteriores anunciou a possível reabertura da embaixada do Azerbaijão no Afeganistão, enquanto a Nicarágua nomeou Michael Campbell como seu embaixador não residente. Em 26 de julho passado, a chancelaria do Uzbequistão aceitou Mohammad Sabir como encarregado de negócios do Emirado Islâmico. Quanto às sanções, a Rússia insinuou a possibilidade de eliminar os “talibãs” de sua lista negra e, em uma medida sem precedentes, o Cazaquistão excluiu o Emirado Islâmico de sua lista de grupos terroristas.

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“Há desafios no Afeganistão que todos conhecem, mas devemos estabelecer relações com o governo atual. Os talibãs governam o país; hoje eles têm o poder, e devemos acompanhar a realidade e estabelecer nossas relações em consequência”, dizia o presidente russo, Vladimir Putin, em 6 de junho de 2023. Como dado destacado, neste mesmo dia o Conselho de Segurança das Nações Unidas levantou temporariamente a proibição de viajar de quatro funcionários do Emirado Islâmico para realizar a peregrinação religiosa do Hajj, na Arábia Saudita.

Durante a mais recente reunião internacional sobre o país, realizada em 5 de agosto passado no Catar, Hamdullah Fitrat, porta-voz adjunto do Emirado Islâmico, pediu aos presentes que reabrissem suas missões diplomáticas e políticas em Cabul.

A nova Constituição do Afeganistão

O destino da Constituição continua sem estar claro. O porta-voz do Emirado Islâmico, Zabihullah Mujahid, disse que se estão realizando esforços para redigir uma carta magna; mas a ausência de uma Constituição não significa que o Afeganistão esteja em um vazio legal.

“Não estamos em um vazio legal. A Xaria (Lei islâmica) define os deveres de cada indivíduo no governo e no sistema”, afirmou. Além da Constituição, outras questões como a formação de um gabinete oficial e a bandeira nacional tricolor continuam no limbo.

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Assim estão as coisas. Incerteza, esta é a palavra de ordem na realidade atual do Afeganistão, que avança como pode em seu caminho para enfrentar dois de seus grandes desafios: reverter a grave crise humanitária que enfrenta (a pior do mundo segundo a ONU) e conseguir o reconhecimento político internacional.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Nicholas Valdes

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