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ToggleNa noite deste domingo (26), o governo do presidente da Colômbia, Gustavo Petro, informou que a crise diplomática com os Estados Unidos foi superada.
A tensão começou após Donald Trump anunciar uma guerra comercial contra a Colômbia, país que se recusou a receber a deportação de colombianos indocumentados transportados em aviões militares. Para Petro, o tratamento violou os direitos humanos e a dignidade dos migrantes.
Em um comunicado à imprensa, o chanceler Luis Alberto Murillo afirmou: “O governo da Colômbia informa que superamos o impasse com o governo dos Estados Unidos”.
Para resolver com dignidade — conforme defende Petro — o caso dos deportados, o governo colombiano “disponibilizou o avião presidencial para facilitar o retorno digno dos conterrâneos que chegariam hoje (domingo) ao país pela manhã, provenientes de voos de deportação“, diz o comunicado.
Em um vídeo divulgado nas redes sociais, o chefe da diplomacia afirmou que continuarão recebendo os colombianos deportados, “garantindo-lhes condições dignas como cidadãos sujeitos de direitos”.
Viagem a Washington
O ministro Murillo informou que viajará junto ao embaixador da Colômbia em Washington, Daniel García-Peña, para “realizar reuniões de alto nível que deem seguimento aos acordos, resultado do trabalho conjunto que levou à troca de notas diplomáticas entre os dois governos”.
Os dois países, horas antes, se envolveram em uma disputa comercial: Trump aumentou tarifas depois que Petro desautorizou o pouso de duas aeronaves militares estadunidenses com deportados colombianos que permaneciam indocumentados naquele país. O líder colombiano respondeu à altura, também elevando taxas a importações estadunidenses.
Aumentam as sanções dos EUA, avançam as reações do Sul Global
Não houve uma ruptura das relações diplomáticas, mas foi um marco na história os dois países chegarem a uma confrontação comercial de resultados imprevisíveis: Colômbia e Estados Unidos nunca haviam escalado seus vínculos a um nível de deterioração como neste domingo, fato que, sem dúvida, colocaria em risco o futuro do país sul-americano por ser o mais vulnerável neste “conflito”.
Trump, após sua decisão unilateral de deportar em aviões militares várias dezenas de colombianos que viviam indocumentados nos EUA, encontrou em Petro uma rejeição contundente, que exigiu de Washington um tratamento baseado no respeito aos direitos humanos e à dignidade das pessoas. “Não posso fazer com que os migrantes permaneçam em um país que não os quer, mas se esse país os devolver, deve ser com dignidade e respeito com eles e com nosso país”, escreveu em sua conta no X.
Desconforto com a Casa Branca
Petro, primeiro mandatário de esquerda a governar a Colômbia em seu trajeto republicano, dispensou eufemismos e não escondeu seu desconforto com a decisão da Casa Branca. Horas antes, já havia escrito: “um migrante não é um delinquente e deve ser tratado com a dignidade de seu ser humano”. E acrescentou: “Por isso, fiz devolver os aviões militares estadunidenses que vinham com migrantes colombianos”.
“A Colômbia deve ser respeitada”, disse ainda Petro, após reivindicar que os colombianos devem ser deportados em aviões civis: “Sem receberem tratamento de delinquentes, receberemos nossos conterrâneos”.
Tensões criadas por Trump impõem à América Latina reação ao imperialismo
A reação de Petro levou Trump, quase que imediatamente, a anunciar em sua rede Truth Social uma série de medidas econômicas contra a Colômbia, as quais, aparentemente, já foram superadas.
Os efeitos para a economia colombiana, se tivessem sido aplicados como inicialmente ameaçado por Trump, teriam sido devastadores, uma vez que os Estados Unidos são o principal parceiro comercial da Colômbia e as exportações em 2024 para o mercado estadunidense representaram cerca de 320 milhões de dólares, sem contar os envios de petróleo e flores, dois itens relevantes na dinâmica comercial entre os dois países.
Retaliação colombiana
Petro chegou a anunciar que autorizava o ministro do Comércio Exterior a “elevar as tarifas de importação dos Estados Unidos em 25%”.
O mandatário colombiano também havia pedido ao ministério que ajudasse a direcionar as exportações colombianas para todo o mundo, exceto aos Estados Unidos: “Nossas exportações devem se expandir. Convido todas as comunidades colombianas no exterior a serem comercializadoras de nossos produtos”.
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Essa foi a resposta técnica, baseada em números e estatísticas, e quando se acreditava que a tréplica pública de sanções entre os mandatários através das redes sociais estava resolvida, no final da tarde de domingo Petro surpreendeu com uma reflexão, rica em história, para dizer a Trump: “Derrube-me, presidente, e as Américas e a humanidade responderão”.
Ele lembrou o golpe de Estado contra Salvador Allende, em 1973, e desafiou: “… Eu morro na minha lei, resisti à tortura e resisto a você”. O impasse foi superado, mas a mensagem de Petro foi eternizada.
O Tapão do Darién
Além da troca de tuítes entre os dois mandatários e o anúncio de suas próprias decisões que, ao final do dia, foram superadas, retorna-se, novamente, à realidade dos migrantes. Além de protocolos, Petro propõe continuar um diálogo franco em torno do Tapão do Darién, a rota que abre o caminho para aqueles que querem buscar “o sonho americano”.
A migração é um tema crucial na Colômbia, uma vez que, na fronteira noroeste com o Panamá, se ergue em sua imensidão a selva do Tapão do Darién, que hoje é a via mais expedita para centenas de milhares de imigrantes africanos, asiáticos e latino-americanos que buscam chegar aos Estados Unidos. Chama-se “Tapão do Darién” porque é uma barreira natural que não permite vias de acesso. Portanto, a travessia dos imigrantes é feita por caminhos inóspitos, em muitos casos controlados por máfias que se aproveitam, inclusive, de famílias inteiras que pagam quantias exorbitantes em dólares para alcançar seu destino.
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“Espero que o diálogo sobre o Darién não seja congelado”, recomendou o presidente Petro a Trump, após lembrar que “se não houver regularização, aumentarão as ilegalidades”. E lembrou: “Já vimos isso quando os Estados Unidos bloquearam a Venezuela e fizeram explodir a onda migratória”.
“Primeiro é a dignidade da Colômbia e da América Latina. Os migrantes são seres humanos e sujeitos de direitos e, como tal, devem ser tratados”, pontuou Petro.
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Paradoxalmente, conforme lembrou o presidente sul-americano, na Colômbia há 15.660 cidadãos estadunidenses estabelecidos de maneira irregular: “Devem se aproximar do nosso serviço migratório para regularizar sua situação”, sugeriu.
Sem dúvida, a reação inicial de Petro deixou um marco nas relações com os Estados Unidos, país acostumado a impor seus desígnios imperiais sem que os governos colombianos do passado assumissem posições dignas e autônomas. O melhor exemplo e o mais recente foi a chamada “guerra contra o narcotráfico”, através do Plano Colômbia, que, no final, deixou mais de 300 mil colombianos mortos, enquanto o consumo de cocaína nunca parou nas ruas de Nova York.
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