A guerra contra as drogas é empiricamente um fracasso total. Os custos humanos, sociais e econômicos são quase incontáveis tanto em outros países como nos Estados Unidos, mas o que se pode comprovar é que depois de 50 anos de aplicar esta estratégia, incluindo a prisão e julgamentos de altos perfis como o de El Chapo e o ex-chefe policial, entre outros, junto com a destruição de tantas comunidades, o resultado é que há mais drogas ilícitas e mais baratas e mais viciados em opiáceos que nunca nas ruas dos Estados Unidos.
Quem e como se decide quais são as drogas ilícitas e como proibir ou controlá-las tem sido desde o início uma decisão política mais que um assunto de lei e ordem ou de saúde pública.
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Foi em junho de 1971 que o presidente Richard Nixon declarou pela primeira vez “uma guerra contra as drogas”, que foi, segundo admitiu depois um de seus principais assessores, John Ehrlichman, uma estratégia política: “A campanha (eleitoral) de Nixon em 1968, e depois a Casa Branca de Nixon, tinha dois inimigos: a esquerda antiguerra e as pessoas negras… Sabíamos que não podíamos declarar ilegal estar contra a guerra ou ser negro, mas sim lograr que o público associasse os hippies com maconha e os negros com heroína, e depois de criminalizar a ambos, poderíamos irromper nessas comunidades. Poderíamos prender seus líderes, assaltar suas casas, desbaratar seus comícios e vilipendiá-los a cada noite nos noticiários. Sabíamos que estávamos mentindo sobre drogas? Claro que sim”.
Alguns meses antes, em dezembro de 1970, Elvis Presley chegou à Casa Branca para visitar Nixon, oferecer-lhe seu apoio na luta contra o que chamou “a cultura de drogas” e recebeu uma placa honorária da agência que depois se converteu na DEA. Nixon lhe disse que “aqueles que usam drogas estão na vanguarda dos protestos antiestadunidenses”, segundo os apontamentos de uma assistente do presidente presente na reunião. Elvis então estava abusando de opiáceos que contribuíram para sua morte por infarto sete anos depois.
O objetivo de Nixon se cumpre de maneira dramática a partir dos anos 1980, em que o número de pessoas encarceradas por delitos não violentos de droga se incrementou de 50 mil em 1980 a mais de 400 mil em 1997. Atualmente, uma média de 500 mil seguem detidos sob estas medidas afetando sobretudo minorias raciais. “Nada contribuiu mais para as prisões massivas sistemáticas das pessoas de cor nos Estados Unidos do que a guerra contra as drogas”, concluiu a especialista Michelle Alexander.
Ainda antes da declaração dessa “guerra”, os Estados Unidos empregaram leis antinarcóticos como armas políticas contra certas comunidades, por exemplo leis antiópio contra imigrantes chineses em 1870 e leis antimaconha contra mexicanos em princípios do século 20, no Sudoeste.
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68% dos adultos favorecem a legalização da maconha nos EUA
A nível internacional, durante décadas, a “guerra contra as drogas” tem justificado todo tipo de intervenções abertas (Panamá) e encobertas de Washington, como todo tipo de imposição de políticas nas Américas.
Mas esse consenso de meio século está desbaratando. Hoje em dia, dois países que foram os pilares desta “guerra” na região sob o Plano Colômbia e a Iniciativa Mérida recusaram essa estratégia, algo que seguramente está preocupando Washington.
Nos Estados Unidos, opositores a esta guerra conseguiram legalizar a maconha em 21 estados e na capital federal. Inclusive um, Oregon, acaba de aprovar a primeira medida para despenalizar todas as drogas. 68% dos adultos favorecem a legalização da maconha.
Não ajuda a versão oficial de que nos últimos anos ficou revelado que a epidemia de drogadição a opiáceos – responsável pela maioria de um novo recorde de mais de 110 mil mortes por overdose em um período de um ano em 2021 – foi nutrida não por cartazes, mas sim por empresas farmacêuticas estadunidenses e doutores de aventais brancos.
Os responsáveis desta narcopolítica e seus custos não estão, por ora, ante um tribunal.
Bônus Musical | Sly & The Family Stone – I wanna take you higher
David Brooks | Correspondente de La Jornada em Nova York.
Tradução: Beatriz Cannabrava.
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