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Foto: Narendra Modi / X

Índia: Narendra Modi chega a 3º mandato enfraquecido e com rastro de autoritarismo

Democracia indiana se sustentou durante muito tempo em uma sociedade civil ativa, vibrante e diversa, mas Modi tentou restringir esta energia cívica
Andrew Firmin
IPS
Londres

Tradução:

Ana Corbisier

O nacionalista hindu Narendra Modi ganhou seu terceiro mandato como primeiro-ministro da Índia. Mas o resultado das eleições realizadas entre abril e junho não alcançou o triunfo avassalador que parecia estar a seu alcance.

O Partido Bharatiya Janata (BJP, Partido Popular da Índia) de Modi perdeu lugares em comparação com as eleições de 2019, e sua maioria parlamentar.

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Modi continuou sendo primeiro-ministro graças a seus sócios de coalizão, mas está muito longe da supermaioria de 400 lugares que queria, o que lhe teria dado poder para reescrever a Constituição.

Como resultado, pode ser que Modi enfrente mais controles de seu poder. Se for assim, isso só pode ser uma boa notícia para aqueles que atacou sistematicamente, inclusive a sociedade civil e a minoria muçulmana da Índia.

A repressão de Modi

Sob o mandato de Modi, no poder desde 2014, as condições do espaço cívico se deterioraram. As eleições na Índia foram acompanhadas pelas habituais manchetes sobre o país como a maior democracia do mundo. Mas a democracia indiana se sustentou durante muito tempo em uma sociedade civil ativa, vibrante e diversa. Modi tentou restringir esta energia cívica, considerando-a um obstáculo para seu governo altamente centralizado e personalizado.

O governo de Modi recorreu reiteradamente a leis repressivas, como a draconiana Lei de Prevenção de Atividades Ilegais, para acossar, intimidar e deter ativistas e jornalistas com acusações falsas. As forças da ordem realizaram redadas em numerosas organizações da sociedade civil e em empresas de comunicação. Em outubro de 2023, por exemplo, a polícia revistou os domicílios de cerca de 40 empregados do site NewsClick e deteve seu diretor.

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Este foi um dos muitos ataques contra a liberdade de imprensa. Os jornalistas independentes sofrem habitualmente acosso, intimidação, ameaças, violência, detenções e perseguições. No ano passado, o governo proibiu um documentário da BBC sobre Modi, seguindo-se redadas de investigação fiscal nos escritórios indianos da corporação.

As autoridades também utilizaram a Lei de Regulamentação das Contribuições Estrangeiras para bloquear o acesso ao financiamento internacional das organizações da sociedade civil, dirigindo-se àquelas que criticam seus ataques contra os direitos humanos. Em 2020, o governo modificou a lei para torná-la ainda mais rígida, ampliando os poderes para congelar contas bancárias. Desde o princípio de 2022, as autoridades cancelaram o registro de quase 6 mil organizações.

Violência contra manifestações

As autoridades também desencadearam a violência contra manifestantes. Em 2019, a legislação sobre cidadania criou uma via para que os imigrantes sem documentos se tornassem cidadãos indianos, mas só se não fossem muçulmanos. Apesar da Constituição laica da Índia, a lei introduziu critérios religiosos na determinação da cidadania.

A aprovação desta lei discriminatória levou dezenas de milhares de pessoas para a rua. As forças de segurança responderam com cassetetes, gases lacrimogêneos e detenções, acompanhados de cortes de internet.

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O mesmo ocorreu quando os agricultores protestaram em 2020 e 2021, ao considerar que as novas leis agrárias prejudicariam sua capacidade de ganhar a vida. No fim, os agricultores triunfaram e Modi derrogou as leis impopulares. Mas vários agricultores morreram em consequência da dura resposta das autoridades, como quando o carro de um ministro atropelou uma multidão de manifestantes.

Uma vez mais, as autoridades cortaram os serviços de internet e de telefonia móvel, a polícia utilizou cassetetes e gases lacrimogêneos e deteve muitos manifestantes.

Islamofobia e refundação da Índia

Como deixou claro a nova lei de cidadania, os que menos acesso têm aos direitos são os mais atacados. Os muçulmanos são o alvo preferido do BJP, já que pretende refundar o país como uma nação exclusivamente hindu.

Os políticos do partido não deixaram de avivar o ódio contra os muçulmanos, por exemplo, em relação ao uso do jihad, aos matrimônios interreligiosos e à proteção das vacas, um animal venerado no hinduísmo. Modi foi acusado de difundir discursos de ódio contra os muçulmanos e teorias conspirativas, inclusive durante a campanha eleitoral.

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Durante as eleições, qualificou os muçulmanos de “infiltrados” e aludiu à versão indiana de uma narrativa frequentemente avançada por partidos de extrema-direita: que uma população minoritária pretende substituir a maioria mediante uma maior taxa de natalidade e a conversão de seus cônjuges.

A retórica populista do BJP fomentou o ódio e a violência. Em 2020, Delhi viveu seus piores distúrbios em décadas, desencadeados pela violência em protesto contra a lei de cidadania. Grupos de hindus e muçulmanos se enfrentaram e morreram 53 pessoas, na maioria muçulmanos.

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A violência institucional vinda de cima seguiu a revogação unilateral do estatuto especial de autonomia de Jammu e Caxemira em 2019.

A eliminação das proteções constitucionais para esta região de maioria muçulmana veio acompanhada de uma ocupação militar, toque de recolher, proibição de reuniões públicas, restrições de circulação e uma das interrupções de internet mais longas do mundo. As autoridades governamentais indianas detiveram milhares de ativistas de Caxemira e criminalizaram inumeráveis jornalistas.

A desinformação prospera na Índia

Antes das eleições, o Estado deteve políticos chave da oposição, como o ministro principal de Delhi, Arvind Kejriwal, e congelou contas bancárias da oposição, inclusive as de sua principal organização, o Partido do Congresso Nacional. Quase todos os políticos investigados pela Direção de Execução do governo são da oposição.

As eleições indianas sempre duram várias semanas, dado o enorme desafio logístico que supõe permitir que votem até 969 milhões de pessoas. Mas estas, divididas em 82 dias, foram especialmente longas. Isto permitiu a Modi viajar pelo país e aparecer tanto quanto possível, representando uma campanha que pôs sua personalidade em primeiro plano.

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 Os políticos do BJP difundiram afirmações de que os muçulmanos estavam comprometidos com o que chamavam uma “jihad do voto” contra os hindus, acompanhadas de acusações de que a oposição favoreceria os muçulmanos.

O líder do Partido do Congresso, Rahul Gandhi, foi um dos objetivos, com falsas acusações de vínculos com a China e o Paquistão e vídeos trucados em circulação. Mas apesar dos numerosos desafios, a coalizão opositora obteve melhores resultados do que era esperado. O resultado sugere que pelo menos alguns estão cansados do culto à personalidade de Modi e da política de polarização.

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E apesar de todas as tentativas do BJP para destacar o êxito econômico, muitos eleitores não se sentem melhor. O que lhes importa é o aumento dos preços e o desemprego, e julgaram o presidente em consequência.

É de esperar que o resultado leve a uma mudança de estilo, com menos retórica divisionista e mais ênfase no compromisso e na busca de consenso. Pode ser que seja pedir muito, mas agora a oposição poderia desempenhar melhor seu papel de prestação de contas. Modi perdeu seu brilho de invencibilidade. Para a sociedade civil, isto poderia abrir oportunidades para contra-atacar e instar o Governo a deter sua investida.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Andrew Firmin Redator chefe da Civicus, codiretor e redator da Civicus Lens e coautor do Informe sobre o Estado da Sociedade Civil da organização.

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