Pesquisar
Pesquisar
Foto: Jewish Voice for Peace / X

Protestos pró-Gaza resistem à repressão nos EUA; mais de 2 mil estudantes já foram presos

Autoridades das universidade e políticos continuam respondendo com cada vez mais violência aos movimentos, que repercutem nas mídias e nas redes
David Brooks, Jim Cason
La Jornada
Washington, DC

Tradução:

Beatriz Cannabrava

Protestos de universitários, que exigem o fim do apoio dos Estados Unidos à guerra de Israel em Gaza e a retirada de investimentos e outros vínculos com Tel Aviv, não têm cessado nos EUA, apesar da repressão policial e das autoridades acadêmicas contra os acampamentos, com mais de 2 mil prisões acumuladas, enquanto novos aliados surgem entre os sindicatos acadêmicos ameaçando com greves em apoio às demandas estudantis, alimentando ainda mais a preocupação entre a cúpula política nacional.

Nesta quinta-feira (2), o presidente Joe Biden foi obrigado a responder aos protestos em uma mensagem onde tentou reconhecer a validade das expressões enquanto as criticava. “Não somos uma nação autoritária onde silenciamos as pessoas”, afirmou em comentários à imprensa. “De fato, o protesto pacífico está na melhor tradição de como os americanos respondem a questões de consequência”, disse.

Leia também | Gestores de universidades nos EUA usam táticas de Israel contra estudantes pró-Palestina

Mas Biden enfatizou que também “somos um país de leis” e, como fez anteriormente, caracterizou alguns dos protestos como violentos e antissemitas. “O vandalismo entrou sem permissão, quebrando janelas, fechando campi, forçando o cancelamento de aulas e formaturas, e nada disso é protesto pacífico”, acusou.

Essa mensagem foi contraditória para muitos. “A afirmação do presidente Biden de que ‘a dissidência nunca deve levar à desordem’ desafia a história dos Estados Unidos, desde o Boston Tea Party [ato de protesto contra o império britânico, parte do início da luta pela independência] até as táticas usadas pelos ativistas dos direitos civis, manifestantes contra a guerra do Vietnã, ativistas anti-apartheid para enfrentar injustiças”, comentou Edward Ahmed Mitchell, subdiretor executivo nacional do Conselho de Relações Americano-Islâmicas, a maior organização muçulmana de direitos civis dos Estados Unidos. “E se o presidente realmente está preocupado com o conflito nas universidades, ele deveria condenar especificamente as forças de segurança pública e as gangues pró-Israel por atacar os estudantes e parar de facilitar o genocídio em Gaza que desencadeou os protestos”, concluiu.

Leia também | EUA agonizam: envio de R$ 490,4 bi para guerras é perigo global, mas reflete fim da era unipolar

Peter Beinart, editor da revista judaica Jewish Currents e colunista proeminente, acrescentou que “quando as pessoas olharem para trás desses eventos, verão o momento em que começou um debate real sobre a cumplicidade universitária e governamental na opressão dos palestinos. E os protestos tornaram isso possível [o debate]”.

Repressão é cada vez maior

As autoridades das instituições de ensino superior e os políticos continuam respondendo cada vez mais com repressão e repúdio ao movimento de protesto tão visível na mídia e nas redes sociais. Na Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), policiais antidistúrbios disparando gás lacrimogêneo e balas de borracha invadiram mais uma vez o campus na manhã de 2 de maio para prender estudantes e desmantelar à força o acampamento de tendas que foi estabelecido para exigir que essa universidade cortasse todos os laços com Israel, incluindo a retirada de investimentos em empresas com negócios relacionados a esse país, e que se declarasse a favor de um cessar-fogo em Gaza. Vários tipos de sufocamento do direito à protesto, com mais de 2 mil prisões, ocorreram em pelo menos 36 instituições de ensino superior em várias partes do país, reporta a Ap.

O prefeito de Nova York, o ex-capitão de polícia Eric Adams, justificou a força policial na desmontagem do acampamento e contra a ocupação de um prédio por manifestantes na semana – assim como os dirigentes acadêmicos – acusando a presença de “agitadores externos”. E foi mais explícito: “há um movimento para radicalizar os jovens, e não vou esperar até que ele tenha sucesso e de repente reconhecer a existência disso”. Mas não há evidências da existência de tal complô ou de uma ampla presença de pessoas externas, já que a grande maioria dos presos faz parte da comunidade acadêmica.

Leia também | Gestores de universidades nos EUA fomentam repressão a atos pró-Palestina: “Optaram pelos lucros”

Além disso, os acadêmicos que supostamente estavam entre os protegidos por essas ações estão protestando contra a repressão. Em resposta à decisão das reitorias de solicitar a intervenção de agentes de segurança pública contra os protestos pacíficos, o sindicato de 48 mil estudantes de pós-graduação no sistema da UCLA em todo o estado convocou uma consulta para autorizar uma greve contra a administração universitária. “O uso e a sanção da força violenta para conter o protesto pacífico são um ataque à liberdade de expressão e ao direito de exigir mudanças, e a universidade deve se sentar com os estudantes, sindicatos e organizações do campus para negociar em vez de aumentar a tensão”, escreveu a diretoria executiva da seção 4811 do UAW ao explicar a razão da greve que propõem.

Na Universidade de Columbia em Nova York, o grêmio de professores, a Associação Americana de Professores Universitários (AAUP), também pediu por um voto de não confiança contra a reitora dessa universidade por autorizar a entrada da polícia para desmantelar os protestos e por solicitar que os agentes permaneçam no campus até o final das cerimônias de formatura, no meio de maio.

Leia também | Islâmico, muçulmano, árabe, palestino: entenda a diferença e a relação entre esses termos

Na Dartmouth College em New Hampshire, a televisão local WCAX 3 relatou que dezenas de professores abandonaram suas salas de aula ontem em protesto depois que um comando de policiais antidistúrbios desmantelou um local de protesto estudantil e prendeu mais de 80 pessoas. No campus da Universidade George Washington na capital do país, o acampamento se expandiu desde que legisladores federais de direita exigiram que as autoridades desocupassem os estudantes. Ainda no dia 2, se ouviam cantos e discursos do acampamento a várias quadras de distância, enquanto crescia a concentração de alunos e aliados exigindo que todas as universidades de Washington retirem todo o investimento em empresas israelenses e pressionem a favor de um cessar-fogo imediato.

Leia também | Lejeune Mirhan: Apoio dos EUA ao genocídio em Gaza é política herdada do Reino Unido

Enquanto isso, diante das notícias de esforços de universidades como a Columbia – casa dos Prêmios Pulitzer de Jornalismo – para proibir a entrada de jornalistas e, em alguns casos, limitar o acesso, o Comitê de Proteção aos Jornalistas criticou essas medidas e declarou que os jornalistas “devem ser autorizados a cobrir os protestos nos campi sem temer por sua segurança”.

O estudante Cameron Driggers, que participa dos protestos na Universidade da Flórida, o primeiro de sua família a chegar à universidade e que depende de uma bolsa de estudos, enfrenta com seus companheiros a ameaça de ser expulso, informou à Truthout: “temos a obrigação de obstruir e protestar o máximo possível”. E agregou: “eu sei que a história nos reivindicará, como fez com quase todo movimento estudantil na história, e posso viver com isso. Necessito poder dizer aos meus filhos e família no futuro que tentei fazer algo sobre isso (a guerra contra os palestinos), não importa as consequências”.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.
Jim Cason Correspondente do La Jornada e membro do Friends Committee On National Legislation nos EUA, trabalhou por mais de 30 anos pela mudança social como ativista e jornalista. Foi ainda editor sênior da AllAfrica.com, o maior distribuidor de notícias e informações sobre a África no mundo.

LEIA tAMBÉM

Rússia Uso de minas antipessoais e mísseis Atacms é manobra dos EUA para prolongar conflito
Rússia: Uso de minas antipessoais e mísseis Atacms é manobra dos EUA para prolongar conflito
Após escalar conflito na Ucrânia com mísseis de longo alcance, EUA chamam Rússia de “irresponsável”
Após escalar conflito na Ucrânia com mísseis de longo alcance, EUA chamam Rússia de “irresponsável”
Misseis Atacms “Escalada desnecessária” na Ucrânia é uma armadilha do Governo Biden para Trump
Mísseis Atacms: “Escalada desnecessária” na Ucrânia é armadilha do Governo Biden para Trump
1000 dias de Guerra na Ucrânia estratégia de esquecimento, lucros e impactos globais
1000 dias de Guerra na Ucrânia: estratégia de esquecimento, lucros e impactos globais